A falta da substituição  de equipamento obsoleto do helicóptero de resgate da polícia de Las Vegas/EUA pode ter causado a morte de oficial no ano passado.

O gancho e o guindaste do helicóptero da equipe policial de busca e salvamento de Las Vegas usados durante uma missão em Mount Charleston, no dia 22 de julho de 2013, quando o oficial  David VanBuskirk faleceu após cair de uma altura de 7.6 metros, depois de ter se desprendido do guindaste. O gancho foi considerado perigoso e foi substituído após o incidente. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

O gancho e o guindaste do helicóptero da equipe policial de busca e salvamento de Las Vegas usados durante uma missão em Mount Charleston, no dia 22 de julho de 2013, quando o oficial David VanBuskirk faleceu após cair de uma altura de 7.6 metros, depois de ter se desprendido do guindaste. O gancho foi considerado perigoso e substituído após o incidente. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

Após mais de um ano, a morte do oficial David VanBuskirk, da empresa de aviação Metro, que caiu enquanto elevava por um helicóptero um alpinista retido em Mount Charleston, permanece sob investigação. Os colegas de trabalho de VanBuskirk e especialistas nacionais em busca e salvamento suspeitam que o oficial caiu porque o seu departamento usou um gancho de resgate sem a trava de segurança.

Ken Phillips, chefe da área de busca e salvamento do Serviço Nacional de Parques, disse que os helicópteros de resgate mais “progressivos” usam há muito tempo o gancho com trava.

“Eles são muito comuns agora no setor de helicópteros de resgate, disse Phillips.

A Equipe de busca e salvamento do Condado de Los Angeles, por exemplo, fez a troca há mais de 15 anos.

“Se você possui um equipamento sem trava em qualquer coisa que tenha a ver com resgate… você está chamando pelo fracasso,” disse Hank Reimer, chefe veterano de tripulação de helicópteros de resgate em Los Angeles.

Mas, o Metro não sabia do problema até o falecimento de VanBuskirk, disseram autoridades.

O Capitão Charles Hank, que supervisiona a unidade de aviação do departamento, disse que não se deve culpar ninguém.

“A segurança é responsabilidade de todos, do xerife para baixo”, disse Hank.

O Xerife do Condado de Clark, Doug Gillespie, disse que não acha que o Metro deixou de fiscalizar a segurança da unidade. “Quando nos encontramos com outras agências ao longo dos anos, incluindo muitas que usavam os ganchos com trava, ninguém disse que os ganchos do Metro eram um problema”, disse ele.

“Em todas as discussões que tivemos sobre uma variedade de coisas, ninguém, em nenhum desses encontros, disse… ‘Ei, vocês fazem uso deste gancho defeituoso?’ ” disse ele. “Não vejo isso como um lapso.”

Alguns meses depois do acidente, o Metro substituiu os ganchos em todos os seus helicópteros de resgate.

ROMPIMENTO FORÇADO

VanBuskirk, 36 anos, foi um dos cinco oficiais da equipe de resgate enviado para ajudar um alpinista retido na margem da Mary Jane Falls, no dia 22 de julho de 2013.

Tratava-se de uma missão noturna rotineira para a ativa unidade de busca e salvamento, que realiza mais de 100 resgates de helicóptero por ano. O tempo estava calmo, com pouco vento. O terreno era íngreme, mas havia espaço suficiente para o oficial se apoiar. VanBuskirk, que possuía seis anos de experiência em busca e salvamento, era um dos oficiais mais experientes.

Depois de localizar o alpinista, o oficial desceu por um cabo de guindaste elétrico do helicóptero. O seu equipamento estava preso ao gancho do cabo com um pesado mosquetão de alpinista.

O plano era que VanBuskirk colocasse o alpinista em um equipamento de segurança e o prendesse ao mesmo gancho do guindaste. Os oficiais, às vezes, desprendem-se do cabo enquanto estão em solo, mas isto não fazia parte do plano da missão e VanBuskirk não comunicou, em momento algum, que tinha a intenção de fazê-lo.

VanBuskirk deu o sinal para o operador de guindaste para que ele e o alpinista fossem levantados, mas o oficial apresentou dificuldades durante a subida e caiu de uma altura de cerca de 7.6 metros, e acabou falecendo. O alpinista, que não foi identificado pelo Metro, alcançou o helicóptero com segurança.

Os investigadores do Metro disseram que nenhum equipamento de VanBuskirk estava quebrado, e tudo funcionava bem.

Investigadores examinam o equipamento que o policial de Las Vegas David VanBuskirk vestiu quando ele despencou no dia dia 22 de julho de 2013, busca e salvamento em Mount Charleston. As autoridades suspeitam que o acessório de ligação do mosquetão do oficial se enrolou no gancho, provocando a sua queda do guindaste. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

Investigadores examinam o equipamento que o policial de Las Vegas David VanBuskirk vestiu quando ele despencou no dia 22 de julho de 2013, durante uma missão de busca e salvamento em Mount Charleston. As autoridades suspeitam que o acessório de ligação do mosquetão do oficial se enrolou no gancho, provocando a sua queda do guindaste. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

Os membros da equipe de busca e salvamento logo focaram em um “rompimento forçado”, que pode acontecer quando um cabo frouxo permite que o mosquetão no equipamento do socorrista se enrole por cima do gancho, abrindo a mola do gatilho e forçando o mosquetão a se separar do gancho.

Os ganchos sem trava foram utilizados pelos militares há mais de 50 anos, mas nas últimas duas décadas têm sido substituídos pelos ganchos com trava de segurança, pois não abrem facilmente.

Reimer, assim como outros especialistas do setor cientes da morte de VanBuskirk, demonstrou surpresa pelo fato do Metro não estar usando ganchos com trava, já que o rompimento forçado é de conhecimento geral entre os socorristas e alpinistas.

“Se você não tem esse tipo de formação, e logo começa colocando algo no gancho, acidentes podem acontecer,” disse ele. “Pura falta de conhecimento, eu diria, por falta de um termo melhor.”

Phillips, que abriu uma academia nacional de busca e salvamento em 2012, publicou no ano passado um manual de treinamento de 100 páginas que trata sobre o rompimento forçado.

“Todo o pessoal envolvido em operações de resgate de guindaste, principalmente os socorristas de solo, devem ser bem informados sobre o fenômeno do rompimento forçado e como preveni-lo”, escreveu Phillips. Um gancho com trava oferece uma segurança maior, ele escreveu.

Mas, Hank declarou que ninguém sabia disto no Metro.

“Se soubéssemos disto (antes), teríamos mudado imediatamente,” disse Hank.

Alguns meses depois do incidente, o Metro encomendou ganchos com dupla trava, que custou cerca de US$ 1.400,00 cada.

Apesar dos oficiais do Metro terem dito que eles não estavam cientes do rompimento forçado, muitos de seus parceiros estavam. As unidades de resgate e salvamento da Polícia Rodoviária de Los Angeles e Califórnia, entre outras, sabiam do problema e poderiam ter compartilhado os seus conhecimentos caso tivessem  sido procuradas.

O Metro está atrás de pareceres, disse Reimer, que é vice-presidente de uma organização voltada para o treinamento e a segurança de helicópteros de resgate.

“Desde esse incidente, eu tenho tido várias conversas com diferentes pessoas do Metro, questionando sobre como fazemos as coisas, como treinamos, quais equipamentos usamos. Perceberam que há agora um problema e estão tentando resolver isto da melhor maneira, disse ele.

“Infelizmente foi necessário perder uma vida para que isso acontecesse.”

‘NÓS NÃO SABEMOS O QUE ACONTECEU’

O Tenente da unidade de Apoio Aéreo Jack Clements disse que o Metro está aguardando que o Conselho Nacional de Segurança em Transportes (NTSB) termine a sua investigação para liberar os detalhes sobre a morte do oficial. Ele ressaltou que ainda não foi comprovado que o rompimento forçado foi a causa oficial.

“Existem muitas possibilidades. É este tipo de coisa que nos enlouquece,” disse ele. “Nós queremos saber o que aconteceu. E não sabemos o que aconteceu.”

Mas, os colegas de trabalho de VanBuskirk parecem estar convencidos.

Quase todos os oficiais que participaram da missão citaram o rompimento forçado quando foram entrevistados pela Administração de Saúde e Segurança Ocupacional (OSHA) de Nevada, em outubro, meses depois do acidente. O Metro, por esta altura, já tinha substituído os seus ganchos.

Se não foi rompimento forçado, foi erro humano. De acordo com a OSHA, o alpinista disse às autoridades que ele achava que o oficial não estava amarrado ao equipamento quando o operador de guindaste começou a levantá-los.

Mas, é improvável que VanBuskirk teria se soltado sem falar com ninguém.

“Dave desceu com a intenção de se manter amarrado”, disse Hank. “E eu diria que ele era um dos nossos melhores. Era muito bem treinado, um profissional, e não havia nenhuma dúvida ou preocupação quanto à sua competência. Ele era mais do que competente. Repito, o melhor dos melhores.”

Clements disse que os oficiais, às vezes, mudam seus planos quando estão diante de situações inesperadas.

“Tudo muda. Até você de fato descer, tocar o chão e verificar a situação, não há nenhum plano estabelecido porque você não sabe o que vai encontrar,” disse Clements.

Ao mesmo tempo, ele disse, as testemunhas, muitas vezes, interpretam os detalhes de forma errada, experienciam visão em túnel ou perda auditiva temporária.

“De repente, aparece um helicóptero com todas aquelas luzes vindo em sua direção, com alguém descendo por um gancho para lhe pegar, o barulho é alto e tem um monte de coisas acontecendo,” disse ele. “Eu acho que a lembrança (do alpinista) é a melhor lembrança que ele pode nos oferecer, mas a compreensão daquele estresse todo provoca coisas estranhas nas pessoas.”

O investigador da OSHA foi incapaz de determinar a causa e fechou o caso em janeiro sem emitir uma intimação para o Metro.

Helicóptero policial de Las Vegas usado durante a missão de busca e salvamento em Mount Charleston no dia 22 de julho de 2013, quando o oficial  David VanBuskirk caiu de uma altura de 7.6 metros, após se desprender do guindaste. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

Helicóptero policial de Las Vegas usado durante a missão de busca e salvamento em Mount Charleston no dia 22 de julho de 2013, quando o oficial David VanBuskirk caiu de uma altura de 7.6 metros, após se desprender do guindaste. Foto: Cortesia da Administração de Saúde e Segurança Ocupacional de Nevada

NOVO EMPURRÃO PARA A SEGURANÇA

Os oficiais do Metro disseram que agora estão determinados a manter os padrões da indústria. Este ano, o oficial veterano Bill Cassell assumiu a recém-criada posição de agente de segurança na área de busca e salvamento.

Cassell disse que a sua função é documentar a segurança e “pesquisar os padrões da indústria e verificar se há algo ocorrendo que deveríamos, possivelmente, estar fazendo mas, não estamos. Ou, se há algo que poderíamos estar fazendo melhor do que estamos fazendo.”

Ainda não está claro se a morte de VanBuskirk poderia ter sido evitada caso o departamento tivesse criado esta posição antes. Cassell disse que ele duvida que ele teria identificado os ganchos antigos como um problema.

“Não há absolutamente nada que teria voltado a minha atenção para aquele equipamento,” disse ele. “Eu poderia estar aqui há cinco anos mas, não acredito que a minha presença teria evitado essa tragédia de maneira alguma.”

As unidades de todo o país adquiriram os ganchos com trava no início de 2000, disse Butch Flythe, um oficial aposentado de helicóptero de resgaste da Guarda Costeira dos Estados Unidos que desenvolve e vende produtos para a Aerial Machine and Tool Corp. baseada em Virgínia, uma das duas empresas dos EUA que fabrica os ganchos.

“Tem havido um crescente aumento de consciência nas forças armadas e na aviação policial,” disse ele. “As pessoas chegaram a conclusão que, pela forma como operamos, temos que optar pelo uso do gancho com trava.”

Mas, não há um padrão nacional em relação aos ganchos de resgate, disse Flythe.

O exército tem demorado para adotar o novo equipamento porque as suas grandes hierarquias são, muitas vezes, mais difíceis de serem penetradas, disse ele.

Flythe disse que a unidade especial de aviação do Exército, o ‘Caçador Noturno’, começou a usar os ganchos com trava no início das guerras do Iraque e Afeganistão. A Guarda Costeira fez a mudança em 2005 ou 2006, disse ele.

Já a Marinha mudou para o gancho com trava apenas no mês passado, disse Flythe, enquanto a Força Aérea tem comprado ganchos sem trava para modificá-los e usá-los com pinos de trava.

O Condado de Washoe não havia feito a mudança para os ganchos com trava até a morte de VanBuskirk, segundo oficiais do Metro. O Condado de San Diego trocou apenas cerca de um ano atrás.

“É uma daquelas coisas que as pessoas só fazem até que algo deste tipo acontece (a morte de VanBuskirk),” disse Flythe. “Pelo menos em Las Vegas, as pessoas foram reativas ao problema. Houve um departamento que disse, ‘Nós temos que adquirir o gancho com trava imediatamente.’ ”

Embora a queda fatal de um helicóptero de resgate na Austrália na década de 90 fora atribuída ao rompimento forçado, tem havido poucas — se é que existiram — notificações públicas subsequentes. A Administração Federal de Aviação aparentemente nunca emitiu uma advertência sobre ganchos sem trava.

E as empresas de guindaste nunca advertiram os seus clientes sobre os ganchos sem trava, que eles ainda vendem.

“Não houve nenhuma recordação”, disse Hank. “Nenhum aviso foi dado pelo fabricante porque não é uma questão de falha do gancho. É um fenômeno que pode ocorrer.”

O vice-chefe Pat Neville disse que não havia uma discussão nacional ampla sobre os méritos do gancho. “Ele não foi tratado como um problema gritante”, disse ele.

“Era apenas uma das questões em uma unidade de aviação com um várias peças móveis,” disse Neville.

Cassell sustenta que o gancho sem trava é seguro e disse que o usaria com confiança.

“Trata-se de um equipamento perfeitamente seguro”, disse Cassell. “Não há absolutamente nada de errado com ele. Se saíssemos hoje, e tivéssemos que voar em uma missão, eu colocaria você e eu debaixo daquele gancho num piscar de olhos.”

Reimer comentou que a mudança ocorre lentamente em serviços de emergência.

“Eu tendo a ir para além da bolha quando trata-se de buscar informações. … Mas, geralmente, as pessoas têm uma mente fechada. A forma deles é o único jeito, disse ele. Eles não compartilham informações, não escutam, não se aproximam de outras agências. Isto é muito comum nos serviços de corpo de bombeiros e aviação policial”.

“Você tem que olhar para fora da caixa”, disse ele. “Ver o que as outras pessoas estão fazendo e descobrir o porquê, em vez de reconstruírem a roda.”

Gillespie disse que os oficiais do Metro alertaram outros departamentos sobre o rompimento forçado e os ganchos sem travas logo após a morte de VanBuskirk.

“Nós mudamos. Deixamos isso muito claro para os outros departamentos de polícia,” disse ele. “Mas mesmo assim, sabemos que alguns deles não mudaram.”

CONTROLE MAIOR

A unidade aérea do Metro tem sido intensamente analisada desde 2012, após dois incidentes.

Em maio de 2012, um helicóptero de resgate passou cortando uma parede de Red Rock Canyon com as suas lâminas de rotor, durante uma missão de treinamento, quase matando sete oficiais. E em setembro de 2012, um helicóptero de US$ 1 milhão foi destruído e dois pilotos ficaram feridos quando a aeronave começou a girar durante um exercício de treinamento no Aeroporto de North Las Vegas.

O Tenente Gawain Guedry , um ex-piloto policial e dois outros oficiais estão investigando. Mas, o departamento recusou-se firmemente a liberar os seus achados. De acordo com vários funcionários que leram o relatório, Guedry identificou uma cultura de “caubói” e uma falta de supervisão administrativa que havia assolado a unidade por décadas.

O Metro pôs fim à investigação em julho de 2013, embora um rascunho do relatório inacabado foi enviado para o sub-xerife Jim Dixon com um aviso arrepiante:

“A nossa agência tem tido muita sorte, até agora, em termos de não perder uma única vida para um acidente de aviação. Essa sorte pode não continuar,”escreveu Guedry.

Em algumas horas VanBuskirk estava morto.

Ao recusar a liberação do relatório de Guedry, o Metro cita privilégio executivo relacionado ao documento utilizado para fins internos. O departamento disse que o relatório é inutilizável porque possui deduragem e “questões de personalidade.”

Em sua investigação da morte de VanBuskirk, a OSHA pediu repetidamente acesso ao relatório. Mas, os pedidos do investigador foram rejeitados pelo Metro todas as vezes.

Não está claro como o relatório do Guedry pode se relacionar com a morte de VanBuskirk. Guedry, através de seu advogado, indicou que ele acreditava que as conclusões do relatório pudessem impedir outra morte. Ele solicitou que tanto a promotoria do Condado de Clark quanto a procuradoria geral de Nevada determinassem se o Metro violou alguma lei ao recusar a liberação do relatório.

Guedry aposentou-se na sexta-feira, poucos dias depois da reunião em que as suas acusações foram discutidas com os oficiais do Condado de Clark.

É incerto se o NTSB foi capaz de obter o relatório para a sua investigação em curso.

“Todos da área estão muito interessados em saber quais são as conclusões do NTSB”, disse Phillips. “Meio que me surpreende o fato de terem levado tanto tempo para chegarem a uma conclusão.”

Clements disse que ele não está confiante que o NTSB esclarecerá o incidente, porque é quase impossível de provar se o VanBuskirk cometeu um erro, ou  se ele foi vítima de um “fenômeno” de rompimento forçado.

Mas, ninguém da área de busca e salvamento parou de questionar.

“A coisa mais triste para nós é… que todos os dias, quando viemos trabalhar, e entramos pela porta da frente, deparamos com uma foto dele,” disse Clements. “E nós olhamos para ela. E todo mundo quer saber o porquê.”

Fonte: Las Vegas Review Journal/ Reportagem: Mike Blasky