Este artigo foi publicado na Revista Científica de Segurança de Voo – Conexão SIPAER e autorizada sua publicação no site Piloto Policial. O artigo tem os seguintes autores: SOUZA, R., LÍRIO, T., LAUFFER, J. Survivability nas operações em helipontos elevados na cidade de São Paulo. Conexão SIPAER, v.1, n.2, mar. 2010, ISSN 2176-7777. Disponível em: http://inseer.ibict.br/sipaer/index.php/sipaer/article/view/31. Acesso em: 19 Abr. 2010.

A Revista Conexão SIPAER é uma publicação científica periódica, editada eletronicamente pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA) com o objetivo de promover a disseminação da informação técnico-científica produzida por pesquisadores e profissionais da área da ciência aeronáutica e ciências afins voltada para a segurança de vôo, com foco nas atividades de investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos.

Esta revista, que se encontra na segunda edição, apresenta ótimos artigos e uma excelente fonte de consulta. Clique e leia os artigos da primeira e segunda edição da Conexão SIPAER.



RAUL SOUZA, THIAGO LÍRIO e JACKSON LAUFFER

RESUMO: São Paulo é uma cidade particular no mundo quando se trata de assuntos relacionados ao tráfego aéreo de helicópteros. Possuidora de um trânsito caótico e de uma população com poder aquisitivo suficiente para usufruir das vantagens que o transporte aéreo oferece, a capital paulista possui hoje um dos maiores movimentos de aeronaves de asas rotativas do globo terrestre. A utilização cada vez mais frequente deste artifício, faz com que se aumente a preocupação a respeito da segurança na operação destas aeronaves. Por possuir características de uma metrópole, com muitos prédios e poucas áreas livres de obstáculos para a operação aérea, é muito comum a utilização de helipontos elevados no dia a dia dos usuários e operadores de helicópteros. Porém poucos estudiosos têm se dedicado a análise da influência que os ventos, a geometria das edificações e as características operacionais exercem em termos de survivability para os helicópteros, durante as fases de decolagem e pouso em edifícios. Este artigo apresenta a influência dos ventos no topo de edificações, analisando a suscetibilidade dos helicópteros aos efeitos de rajadas, martelamento e desprendimento de vórtices, além da vulnerabilidade das aeronaves uma vez inseridas neste contexto, tudo isso com o objetivo de avaliar a capacidade de survivability para operações em helipontos elevados.

PALAVRAS-CHAVE: Survivability. Helicópteros. Helipontos elevados.

1. INTRODUÇÃO

Com 400 voos diários de helicóptero em média, São Paulo vive hoje uma situação de tráfego aéreo intenso. Pressionada por associações de bairros, a Prefeitura de São Paulo acaba de sancionar uma lei que pretende restringir a circulação de helicópteros e regularizar os 129 helipontos que funcionam sem licença municipal (SALLES et alii, 2009).

De acordo com Salles et alli (2009) São Paulo abriga hoje um cenário ímpar na aviação de helicópteros no mundo. O colapso do trânsito, a presença de população com elevado poder aquisitivo e a falta de segurança pública fazem o uso dos helicópteros um ato rotineiro.

Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC, 2009), atualizados em junho de 2009, existem hoje cerca de 530 helicópteros operando na capital paulista, ou seja, 69% da frota brasileira.

Atualmente, no Brasil, mais precisamente na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), estão sendo realizados estudos de engenharia em túnel de vento. O túnel de vento da UFGRS, que leva do nome do engenheiro Joaquim Blessmann, foi projetado para realizar ensaios estáticos e dinâmicos de modelos de construções civis. As principais áreas de estudo hoje estão classificadas em ambiental, meteorológica, estrutural e construtiva, não abordando a operação de helicópteros em helipontos no topo de edificações (REISDÖRFER, 2007).

Para que se torne mais claro o objetivo deste artigo, é necessário que se conheça o conceito de survivability. Segundo Ramos (2009), helicopter survivability é a capacidade de uma aeronave de asas rotativas para evitar ou para suportar um ambiente hostil, produzido por fenômenos naturais ou ação do homem. Esta capacidade pode ser dividida em duas grandes probabilidades, suscetibilidade e vulnerabilidade.

A suscetibilidade é a probabilidade de o helicóptero ser atingido por um mecanismo capaz de causar danos a ele (rajada de vento forte, projéteis, ação de radar, etc.). A vulnerabilidade é a probabilidade desta ameaça/mecanismo de dano “matar” o helicóptero, uma vez que este tenha sido atingido (RAMOS, 2009).

Este artigo objetiva apresentar a influência dos ventos em topos de edifícios, associada à vulnerabilidade e à suscetibilidade que envolve a operação de helicópteros em helipontos elevados na cidade de São Paulo, principalmente no tocante aos efeitos causados pelo turbilhonamento do ar no topo de edificações de altura elevada.

2. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DO VENTO EM EDIFICAÇÕES

Para que haja uma melhor compreensão da participação dos fenômenos causados pelos ventos na operação de aeronaves de asas rotativas, analisaremos a influência dos mesmos em edificações, buscando em especial sua relação com a geração de vórtices e correntes ascendentes que possam afetar as decolagens e pousos em helipontos elevados. A figura 1 apresenta as características dinâmicasdo vento ao encontrar uma edificação.

FIGURA 1 - Efeitos do vento na edificação (BLESSMANN, 1989).

Nota-se que o escoamento, ao atingir um prédio, é perturbado e dividido gerando a barlavento um aumento de pressão com consequentes correntes ascendentes, e a sota-vento uma sucção e respectivas correntes descendentes.

De forma geral, edificações isoladas ou muito altas sofrem influências maiores de ventos do que edificações mais baixas ou com vizinhança. Edifícios de cem metros de altura ou mais, situados em zona urbana, vizinhos a outros edifícios de altura da mesma ordem, sofrerão influência menor que um único edifício de 40 metros de altura isolado (por exemplo, junto a um parque, lago ou campo de aviação). Especial atenção merece os edifícios altos que possuam em sua vizinhança edificações com alturas iguais ou menores que a metade das suas, pois estes sofrerão grande influência de ventos (BLESSMANN, 2005).

Quanto mais alto o edifício, maiores as velocidades e pressões dinâmicas próximas ao ponto de estagnação e, consequentemente, maiores as velocidades próximo ao terreno, pois maior será o gradiente de pressões entre estas duas regiões (BLESSMANN, 2005).

Um edifício mais baixo, situado a barlavento, pode causar majoração de velocidade, pela interação entre vórtice de base do edifício maior e a esteira do menor. Este problema não aparece em edifícios de forma convexa exposta ao vento (por exemplo, um edifício de planta circular) em que o fluxo escapa lateralmente e quase não há corrente de ar descendente (BLESSMANN, 2005).

A distribuição vertical de pressões na face de barlavento está diretamente relacionada com a pressão dinâmica local, que aumenta com a altura, acompanhando o aumento de velocidade. O ponto de estagnação na fachada de barlavento geralmente se encontra em um ponto próximo de 75% a 80% da altura do edifício. Deste ponto para baixo há um fluxo descendente em virtude do gradiente de pressão. Este fluxo penetra no vórtice de base, causando altas velocidades próximo ao solo, como podemos observar na figura 2 (BLESSMANN, 2005).

FIGURA 2 – Distribuição da velocidade na superfície da estrutura (BLESSMANN, 2005).

Observando ainda a figura 2, nota-se que o escoamento atinge o obstáculo com velocidade, sofrendo estagnação no pe (ponto de estagnação), onde a pressão estática é máxima, a pressão dinâmica é mínima e a velocidade tende a zero. A partir do pe o fluxo é dividido e a pressão estática diminui a medida que a pressão dinâmica e a velocidade aumentam. Este comportamento pode ser comparado ao do escoamento que atinge um perfil aeronáutico.

Segundo Blessmann (BLESSMANN, 2005), edificações mais altas enfrentam escoamentos com velocidades maiores. Analisando a figura 3, observase um gradiente horizontal de pressão (p<p1) entre a esteira com baixa pressão (faces laterais e de sotavento) e a região com pressões mais altas (situada próximo à base da fachada de barlavento).

A baixa pressão na esteira a sotavento (p) é proporcional à velocidade do vento no fluxo livre logo acima do topo do edifício (v). Portanto, quanto mais alto o edifício, maior a velocidade dos ventos (a velocidade do vento aumenta com a altura), e mais baixa será a pressão (p). A consequência destes efeitos é uma corrente ascendente no sota-vento da edificação, a qual influencia diretamente a operação de helicópteros em helipontos no topo de prédios. Este aceleramento do fluxo aparece também em passagens abertas, arcadas ou edifícios sobre pilotis, por exemplo (BLESSMANN, 2005).

FIGURA 3 - Gradiente horizontal de pressão (BLESSMANN, 1989).

Blessmann (2005) chama atenção ainda para um forte turbilhonamento que pode ser causado por vórtices que se desprendem das arestas verticais dianteiras do edifício próximo às fachadas laterais.

Quando se tem dois ou mais edifícios expostos diretamente ao vento, as velocidades do escoamento podem ser aumentadas também pelas seguintes razões:

– Efeito Venturi, que provoca um “afunilamento” do vento, com o, conseqüente, aumento de velocidade; e

– Turbilhões que se desprendem dos edifícios situados a barlavento (BLESSMANN, 2005).

Enquanto o efeito Venturi gera aumento das velocidades médias, os turbilhões são responsáveis por flutuações, às vezes, bastante intensas, da velocidade do vento (BLESSMANN, 2005).

Do exposto acima, conclui-se que devem ser evitadas fachadas planas expostas perpendicularmente ao vento, em uma direção sem proteção de edificações vizinhas. Quando possível, mudar a orientação do edifício ou adotar outras providências, como reduzir a altura (vários edifícios baixos em substituição a um de grande altura) ou alterar a forma arquitetônica. Outras sugestões podem ser vistas na figura 4. Também quebra-ventos de espécies vegetais adequados podem ser eficientes, principalmente quando o problema for causado por efeito Venturi (BLESSMANN, 2005).

FIGURA 4 - Sugestões para evitar altas velocidades próximo ao terreno (BLESSMANN, 1989).

3. EFEITOS DINÂMICOS DAS RAJADAS EM EDIFICAÇÕES

Talvez o primeiro método racional para determinar os efeitos dinâmicos das rajadas seja o apresentado por Rausch (1933).

A partir de poucos registros de rajadas de vento existentes naquela época, Rausch apresentou o gráfico reproduzido na Figura 5, como representativo da pressão dinâmica do vento ao longo do tempo.

FIGURA 5 - Variação ao longo do tempo da pressão dinâmica do vento (BLESSMANN, 1989).

Conforme Rausch (1933), quando surge uma rajada de vento, a pressão dinâmica média (q) cresce subitamente (variação qr), permanece constante por um pequeno intervalo de tempo e volta a cair para o valor inicial (q). Com o correr do tempo surgem outras rajadas que aumentam ou diminuem o valor da pressão dinâmica, mas sempre retornando ao valor inicial (q). Rausch afirma que, com base nas observações existentes, não se pode concluir que exista uma periodicidade das rajadas, nem que sua duração seja sempre a mesma. Em outras palavras, o vento não pode ser considerado como originando uma força periódica que possa causar efeitos perigosos de ressonância. Trata-se, continua Rausch, de uma série de cargas e descargas com valores e duração variáveis, separadas por intervalos desiguais de tempo (RAUSCH, 1933)

4. EFEITO DE MARTELAMENTO

Quando uma edificação está situada a sota-vento de diversos obstáculos (naturais ou edificações), ela estará imersa na esteira por eles gerada. A turbulência nesta região é do mesmo tipo da turbulência existente no vento natural incidente nestes obstáculos, com uma gama bastante grande de frequências e turbilhões. Em outras palavras, o espectro de energia é bastante alargado, sem um pico pronunciado (BLESSMANN, 2005).

Se, porém, a edificação estiver situada na esteira de somente uma ou de poucas edificações de dimensões semelhantes, convenientemente situadas, ela poderá estar sendo “martelada” compassadamente por turbilhões gerados nas edificações a barlavento, com uma frequência dominante, a este fenômeno dinâmico dá-se o nome de martelamento ou buffeting. Sendo assim, teremos uma força excitadora periódica que causará efeitos dinâmicos de maior ou menor intensidade. Estes efeitos podem atingir grandes valores quando uma das frequências naturais da edificação coincidir com a frequência dominante nos turbilhões gerados nos outros obstáculos a barlavento, neste caso surgirá um martelamento ressonante na edificação (BLESSMANN, 2005).

Além da frequência, também influirá no martelamento a intensidade dos ventos incidentes. Se a intensidade for pequena, a turbulência do vento incidente pouco influirá na, relativamente bem organizada, esteira do(s) obstáculo(s) a barlavento. Neste caso os vórtices se desprenderão cadenciadamente (vórtices de Kármán) e irão incidir também cadenciadamente na edificação analisada, dando origem a uma força excitadora aproximadamente periódica. O espectro de energia será largo e as vibrações terão menor amplitude (BLESSMANN, 2005).

Pode-se concluir que o fenômeno de martelamento, para um mesmo conjunto de edificações submetido a um vento de mesma velocidade de referência, será tanto mais pronunciado quanto menor for a rugosidade do terreno. A rugosidade à beira-mar é geralmente pequena, portanto os efeitos de martelamento serão maiores. Isto ocorre em virtude dos ventos a beira mar terem maior intensidade, por perderem menos energia ao longo de seu deslocamento, do que em locais com mais rugosidade, como no centro de uma grande cidade, por exemplo. Pela mesma razão, o martelamento será mais pronunciado em edificações situadas em regiões mais isoladas (parques, lagos, etc) ou cercadas apenas por edificações baixas (BLESSMANN, 2005).

Os maiores efeitos dinâmicos de martelamento aparecem com um distanciamento maior entre as edificações. Mesmo com a edificação de barlavento situada a cerca de dez vezes a dimensão característica da base da edificação analisada, podem aparecer efeitos (BLESSMANN, 2005).

Um grande número de autores usa o termo buffeting para definir o fenômeno que em português chamamos de martelamento.

5. EFEITO DO DESPRENDIMENTO DE VÓRTICE

Em muitos corpos rombudos (formato não aerodinâmico) situados em escoamentos com número de Reynolds a partir de 30 aproximadamente, aparece um desprendimento alternado de vórtices, com uma frequência bem definida. Estes vórtices, chamados vórtices de Kármán, geram forças periódicas, oblíquas em relação à direção do vento médio. Considerando suas componentes, as forças alternadas na direção do vento ocorrem na frequência do desprendimento individual dos vórtices, enquanto as forças alternadas na direção transversal ao vento (designadas por forças laterais) ocorrem na frequência do desprendimento de cada par de vórtices (BLESSMANN, 2005).

Essas componentes das forças tendem a produzir oscilações nas direções em que agem. Entretanto, as forças na direção do vento são pequenas em comparação com as forças na direção transversal ao vento. Na prática, oscilações na direção do vento, por desprendimento de vórtices alternados, raramente acontecem (BLESSMANN, 2005).

Por outro lado, oscilações causadas pelas forças periódicas transversais ocorrem em muitas edificações cilíndricas, ou quase cilíndricas (seção transversal variando suavemente). Cilindros de secção retangular (incluindo a quadrada), triangular ou com outras formas de cantos vivos estão sujeitos a excitações mais fortes por desprendimento de vórtices que o cilindro circular, que é o cilindro mais estudado (BLESSMANN, 2005).

Até agora se apresentou subsídios para despertar a discussão de alguns aspectos de survivability relacionados à operação de helicópteros em helipontos elevados. A partir deste ponto serão abordados alguns aspectos operacionais e de regulação da FAA (Federal Aviation Administration) para a operação de aeronaves mono e multimotores nos Estados Unidos, os quais podem contribuir na diminuição da condição de vulnerabilidade e suscetibilidade que os helicópteros brasileiros estão expostos na cidade de São Paulo.

6. DISCUSSÃO

A decolagem de um avião ou de um helicóptero é quase sempre um acontecimento de rotina. Exceção é feita quando o motor perde potência durante a decolagem, uma possibilidade que influencia ambas as aeronaves e suas condições de operação para garantir a segurança. Para os helicópteros aprovados para transporte, a FAA especifica duas categorias de regras: “A” e “B” (PROUTY, 1992).

A principal diferença entre elas é que as regras da categoria “A” exigem que o helicóptero tenha uma capacidade de “stay-up” (capacidade de subir com pelo menos 100 ft/min em voo à frente, após a falha de um motor), enquanto as regras para categoria “B” não o fazem. Automaticamente, isso significa que só helicópteros multimotores podem ser considerados aeronaves de categoria “A”, e que todos os helicópteros monomotores são considerados aeronaves de categoria “B” (PROUTY, 1992).

A vantagem da certificação categoria “A” é que estes helicópteros são autorizados a realizar decolagens e pousos em helipontos elevados no meio de cidades, e voar em rotas ou áreas que não possuem locais de pouso de emergência. As aeronaves categoria “B”, por outro lado, estão restritas a voar em uma rota/altitude padrão de forma que, em qualquer ponto, uma aterragem segura imediata possa ser realizada em caso de falha do motor (PROUTY, 1992).

FIGURA 6 - Distinção de Certificação Multimotor (PROUTY, 1992).

A figura 6 ilustra as distinções, com base no peso bruto máximo e no número de assentos. Normalmente, os fabricantes consideram isto uma vantagem competitiva para a obtenção da certificação categoria “A”, mesmo em helicópteros menores multimotores (PROUTY, 1992).

6.1. Decolagem Segura

O correto procedimento de decolagem para helicópteros da categoria “A” depende do tipo de heliponto. A figura 7 mostra ambos os tipos de decolagem, normal e abortada, a partir de um heliponto relativamente grande (heliponto desimpedido). Neste caso, o objetivo do piloto durante a decolagem deve ser rápida aceleração para uma velocidade com que a demanda de energia é baixa o suficiente para uma subida de 100 ft/min ser mantida no caso de falha de um dos motores (PROUTY, 1992).

FIGURA 7 – Operação em heliponto desimpedido (PROUTY, 1992).

Quanto maior o peso, a altitude e a temperatura, maior será a velocidade mínima de subida, que é conhecida como a velocidade de decolagem de segurança ou Vtoss (Takeoff Safety Speed). O ponto dentro da trajetória de voo em que a Vtoss pode ser atingida sem se aproximar do solo a menos que 35 pés é chamado de ponto de decisão crítica (CDP). Abaixo do CDP, uma falha de motor tem que ser tratada como uma decolagem abortada por flaring e pouso em linha reta à frente (PROUTY, 1992).

A distância total original da decolagem até o ponto de parada final dependerá de onde, ao longo da trajetória, o CDP está localizado. Este, por sua vez, depende do peso bruto do helicóptero e dos efeitos da altitude e da temperatura na potência máxima que pode ser obtida com o motor remanescente (PROUTY, 1992).

Um mesmo heliponto, grande o suficiente para lidar com uma decolagem abortada de um helicóptero totalmente carregado em um dia frio, pode se tornar muito pequeno para um helicóptero operando nas mesmas condições, porém em um dia quente. Neste caso, a carga útil tem que ser reduzida para se manter o mesmo nível de segurança durante a decolagem. Isto não é exclusividade dos helicópteros de transporte. Se a falha de motor ocorrer além do CDP, o helicóptero pode voar para outro local ou retornar ao seu ponto de decolagem em uma condição próxima da condição normal de voo (PROUTY, 1992).

As particularidades para a operação de um heliponto muito pequeno, como helipontos elevados, são mostradas na figura 8.

FIGURA 8 - Operação em heliponto elevado (PROUTY, 1992).

Esta situação requer que uma decolagem abortada determine o retorno ao ponto de decolagem original. Por esta razão, o perfil de voo durante a decolagem deve ser vertical ou ligeiramente backup, a fim de manter o heliponto no campo visual do piloto, e o mesmo ter condições de retornar para o mesmo lugar de onde decolou (PROUTY,1992).

Se a falha de motor ocorre acima do CDP, o piloto pode trocar velocidade por altitude voando à frente, mantendo uma distância vertical de 15 pés e horizontal de 35 pés do heliponto. O piloto deve atentar para se manter fora do diagrama altura x velocidade, popular “curva do homem morto” durante o regime de subida vertical até o CDP. Para um dado helicóptero, isso geralmente significa que o peso bruto admissível para operar em helipontos elevados deve ser menor do que para a operação em helipontos desimpedidos. Isto, naturalmente, tem uma incidência sobre o aspecto econômico da operação visto que, com um mesmo helicóptero, uma quantidade menor de passageiros pagantes pode ser transportada de um heliponto elevado (PROUTY, 1992).

A figura 9 mostra um diagrama para decolagem normal de um helicóptero categoria “A”.

FIGURA 9 - Decolagem Normal Categoria “A” (PROUTY, 1992).

Sabe-se que no Brasil a operação em helipontos elevados é regulada de forma diferente. Em São Paulo, por exemplo, existe grande quantidade de aeronaves monomotoras operando em helipontos elevados e sobrevoando regiões densamente habitadas. Se fossem adotadas regras similares às americanas no Brasil, esses helicópteros, classificados como categoria “B”, seriam considerados desqualificados para este tipo de operação (PROUTY, 1992).

Aliado a essas condições, verificou-se por meio de entrevista com pilotos que operam na cidade de São Paulo, o completo desconhecimento por parte dos mesmos a respeito do comportamento dos ventos no topo de edificações e a influência dos seus efeitos de rajadas, martelamento e desprendimento de vórtices durante as fases de pouso e decolagem em helipontos elevados.

7. CONCLUSÕES

Neste artigo fica evidente a necessidade de se amplificar as pesquisas relacionando o comportamento dos ventos no topo de edificações com a operação de helicópteros em helipontos elevados.

Comentou-se que existe hoje no Brasil uma linha de pesquisa que se dedica a realizar ensaios estáticos e dinâmicos de modelos de construções civis em túnel de vento. Porém esses estudos não englobam a influência do comportamento dos ventos em relação a helipontos elevados.

Tais estudos poderiam aumentar sobremaneira o nível de segurança operacional deste segmento da aviação, o qual vem tendo um crescimento exponencial em nosso país. Além disso, poderiam auxiliar as autoridades certificadoras a tomar decisões no tocante a melhor forma de regular esse tipo de operação, visando prevenir futuros acidentes.

8. SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS

O fomento de pesquisas acadêmicas nesta área, certamente contribuirá para a disseminação destes conhecimentos tão importantes no âmbito da comunidade aeronáutica brasileira. O tema abordado neste artigo é muito vasto e importante. Por este motivo incentiva-se que sejam desenvolvidas pesquisas que possam trazer contribuições, principalmente nas seguintes áreas:

– Efeitos de rajadas ascendentes em helicópteros com baixa velocidade à frente (aproximação final);

– Ensaios dinâmicos em túnel de vento com foco para o comportamento do escoamento e seus efeitos no topo de edificações, e suas influências na operação em helipontos elevados;

– Regulação da operação de helicópteros em áreas urbanas no Brasil com ênfase aos riscos associados ao grande número de aeronaves categoria “B” sobrevoando áreas densamente povoadas; e

– Análise dos efeitos de cliff-edge no topo de edificações e suas influências na operação de helicópteros em helipontos elevados.


REFERÊNCIAS

AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL (Brasil). Helicópteros totalizado por estado, fabricante e modelo, 30 jun. 2009. Disponível em: <http://www.anac.gov.br/estatistica/graficos /Aeronaves/totalHelicopteros.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2010.
BLESSMANN, Joaquim. Introdução ao estudo das ações dinâmicas do vento. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005.
BLESSMANN, Joaquim. Ação do vento em edifícios. Porto Alegre: Editora Universidade/ UFRGS, 1989. (Série Engenharia Estrutural).
PROUTY, R.W. Helicopter Aerodynamics. S.l : Rotary Wing International, PJS Publications Inc, 1992.
RAMOS, R.L.C.B. Survivability em helicópteros. Notas de aula, 2009.
RAUSCH, E. Einwirkung Von Windstössen auf hohe Bauwerke. Zeitschrift des Vereines Deutscher Ingeneiure, n. 17, 29 abr. 1933.
REISDÖRFER, A.F. Engenharia do vento: mais segurança e otimização nas edificações. Conselho em Revista, Rio Grande do Sul: CREA-RS, n. 34, p.14-17, 2007. Disponível em <http://www.ufrgs.br/lac/not%C3%ADcias/CR34.pdf>. Acesso em 18 mar. 2010
SALLES, D.; BERGAMO, G.; SKUJIS,H. Ordem no Céu. Revista Veja São Paulo, 30 out. 2009.


SURVIVABILITY ON ROOFTOP HELIPORT OPERATIONS AT SAO PAULO CITY

ABSTRACT: Sao Paulo is a peculiar city in the world as far as subjects related to helicopter air traffic are concerned. The city’s automobile traffic is chaotic, and there are people with sufficient purchasing power who want to enjoy the benefits of air travel. Downtown São Paulo has one of the largest numbers of rotorcraft movements in the world. The more this kind of aircraft is used, the more concern there is regarding the safe operation of helicopters. Due to the characteristics of the metropolis, with many buildings and few areas free of obstacles for the air operation, it is very common for the users and operators of helicopters to use rooftop heliports in their daily routines. But little research has been devoted to analyze the influence of the winds, the geometry of buildings and the operational characteristics in terms of survivability for helicopters during all phases of takeoff and landing on buildings. This paper presents the influence of wind on top of buildings, analyzing the sensitivity of helicopters to the effects of vortex and their vulnerability in this context, all aiming at evaluating their survivability in rooftop heliports operations.

KEYWORDS: Survivability. Helicopters. Hooftop heliports


AUTORES:

RAUL SOUZA é Oficial Aviador da FAB, Bacharel em Ciências Aeronáuticas pela AFA, Oficial de Segurança de Voo e Investigador Master de acidentes aeronáuticos formado pelo CENIPA, Chefe da Seção de Investigação do SERIPA 3, Mestrando em Segurança de Voo e Aeronavegabilidade Continuada pelo ITA. [email protected].

THIAGO LÍRIO é Oficial Aviador da FAB, Bacharel em Ciências Aeronáuticas pela AFA, Oficial de Segurança de Voo formado pelo CENIPA, Chefe da SIPAA da BACG, Mestrando em Segurança de Voo e Aeronavegabilidade Continuada pelo ITA. [email protected].

JACKSON LAUFFER é Policial Rodoviário Federal, comandante de helicóptero. Graduado em engenharia elétrica pela Universidade Federal de Santa Catarina, Mestrando em Segurança de Voo e Aeronavegabilidade Continuada pelo ITA. [email protected] .