Responsabilidades civil e penal envolvendo Segurança Operacional
16 de agosto de 2024 6min de leitura
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Com a invenção do avião em 1906 a atividade aeronáutica esteve exposta a um desenvolvimento tecnológico acelerado, principalmente após as Grandes Guerras Mundiais.
Primeiramente havia o sentimento de aventura e desafio, sendo que a questão econômica e de segurança não faziam parte do escopo.
Contudo, com o desenvolvimento de aeronaves cada vez mais complexas e maiores, surge a exigência de investimentos substanciais em tecnologia, infraestrutura, bem como, soluções para um transporte cada vez mais eficiente e seguro, haja vista que os acidentes aeronáuticos trazem consequências irreparáveis com as perdas de vidas humanas e custam milhões de dólares anuais.
Sob estes aspectos, a segurança de voo passa a ser vista com “outros olhos”, assumindo grande importância na atividade aeronáutica e, com isso, a necessidade de desenvolvimento de programas de prevenção de acidentes.
Para enfatizar a importância de revisão contínua dos regulamentos, a Organização de Aviação Civil Internacional (ICAO) emite documentos formais conhecidos como “Anexos à Convenção”, que estabelecem as práticas recomendadas (para segurança e regularidade da aviação) e padrões recomendados (obrigações dos Estados contratantes em executá-las).
No Brasil a primeira atividade de investigação registrada foi do acidente ocorrido com um balão de ar quente em 10 de Maio de 1908.
Em 1965 as investigações mudaram de cenário, tendo como base a extração dos ensinamentos das próprias investigações, na forma de recomendações práticas, adequadas e exequíveis em relação aos fatores contribuintes para a ocorrência dos acidentes.
Essas recomendações se transformam em medidas corretivas para que não ocorram acidentes semelhantes. Destarte, o objetivo principal das investigações passou a ser a prevenção de acidentes e não mais a apuração de responsabilidades. Contudo, estas continuam sendo apuradas pelo direito.
Qual a finalidade de uma lei? Regular a vida em sociedade; é o bem comum, ou seja, trazer ordem para as relações sociais. Por exemplo: o artigo 121 do Código Penal descreve a pena para quem comete o crime de homicídio (matar alguém). Se não houvesse pena para este crime haveria mortes em números imensuráveis.
Se o Estado não disciplina a sociedade, esta comete excessos. Contudo, obviamente, não estamos generalizando, uma vez que existem países que vivem sem leis escritas, prevalecendo a ordem e a moral.
O direito estuda e aplica essas relações de direitos e deveres das pessoas. Portanto, o objetivo do direito através de suas leis é exatamente o descrito acima: o bem comum. Transportemos o direito para a atividade aeronáutica. Este colocará as regras para que a atividade aérea seja disciplinada, para que se atinja a finalidade do bem comum.
Conceitualmente, responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano que uma pessoa causou a outra. Atos que geram indenização mediante nexo causal.
Os atos praticados podem ser lícitos (não produzem efeitos de reparação) ou ilícitos – são os que estão em desacordo com o ordenamento jurídico, logo produzem efeitos – que de acordo com as normas legais causam um dano ou um prejuízo a alguém, com isso criam uma obrigação de reparar o dano que foi causado, conforme visto nos art. 186 e art. 927 do Código Civil onde estão as seguintes previsões:
“Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito” e “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. (Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Civil brasileiro, Ed. Saraiva, 2007, p.13,14).
Na seara da responsabilidade penal temos como conceito: “É o dever jurídico de responder pela ação delituosa que recai sobre o agente imputável” 1 (nota).
As condutas delitivas relacionadas à aviação são classificadas em duas espécies: crimes propriamente aeronáuticos (crimes específicos da atividade, relacionados, por exemplo, com a segurança da aeronave e da navegação aérea) e crimes impropriamente aeronáuticos (crimes comuns que acontecem durante a atividade aeronáutica, mas que não afetam a segurança).
Como exemplo podemos citar algumas possíveis contravenções e crimes relativos à segurança operacional.
O artigo 35 da Lei das Contravenções Penais 3.688/41, menciona que “Entregar-se na prática da aviação, a acrobacias ou a voos baixos, fora da zona em que a lei o permite, ou fazer descer a aero nave fora dos lugares destinados a esse fim” traz uma pena de prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa.
Cumpre ressaltar que há exceções para as atividades aéreas de segurança pública e/ou de defesa civil, face às suas peculiaridades, todas descritas na Subparte K do RBHA 91 da ANAC.
Como crime tipificado no Código Penal, podemos exemplificar o artigo 132, que descreve que a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo direto e iminente resulta na pena de detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave, com os devidos cálculos de aumento de pena caso a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorrerem do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.
Outro exemplo, mais conhecido, é o atentado contra a segurança de transporte aéreo, descrito no artigo 261 do mesmo Código Penal, onde a exposição a perigo de aeronave, própria ou alheia, ou a prática de qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação aérea resulta na pena de reclusão, de dois a cinco anos, sendo certo que para que o crime seja consumado, neste caso, não há a necessidade de sinistro. O simples fato de expor a aeronave a perigo já caracteriza o crime.
E se do fato resultar a queda ou destruição da aeronave, a pena de reclusão é aumentada de quatro a doze anos. Cristalino está que há diferenças entre os dois sistemas, principalmente no que tange às investigações, haja vista a prevenção de novos acidentes, vez que a Lei 12.970/2014 traz prioridade e sigilo às investigações e o direito não tem este condão de prevenção.
Sendo assim, é importante que se observe as relações de equilíbrio entre a filosofia de segurança com as penalidades impostas na lei, sendo certo que, independente do resultado, o maior bem a ser protegido é a vida.
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