ADRIANI JOSÉ DE SOUSA
Major PMESP, Piloto Policial de Helicóptero e Comandante da BRPAe Praia Grande.

As operações de salvamento em matas com o uso do Guincho Elétrico, ressurgiu em 2018 no Grupamento de Radiopatrulha Aérea “João Negrão” (GRPAe) após um estudo de pesquisa entregue em 2013, para a adequação de novos equipamentos e para adequar as atuais técnicas em utilização no GRPAe, durante os apoios prestados ao Corpo de Bombeiros e ao COE. Essa foi uma proposta que surgiu em 2011, devido à necessidade de se efetuarem pesquisas no segmento de apoio nas ocorrências de busca em matas, onde o emprego do helicóptero modelo “Esquilo” como ferramenta de apoio tornou-se praticamente um padrão estabelecido na Unidade.

Atualmente o GRPAe possui dez Bases Operacionais destacadas pelo interior do Estado de São Paulo, cada qual com suas peculiaridades e demandas específicas.

O emprego do helicóptero modelo AS-350 Esquilo como ferramenta de apoio em salvamento em matas, utilizando técnicas baseadas no uso de cordas específicas, tornou-se praticamente um padrão estabelecido nas unidades aéreas no país, e em São Paulo o quadro não se apresenta de forma diferente.

Ao analisar a demanda dessa modalidade de salvamento no GRPAe, notou-se que vinha aumentando significativamente nos últimos anos, exigindo dos operacionais o aperfeiçoamento de suas técnicas, consolidadas durante anos, as quais se tornaram referência para várias Organizações de Aviação de Segurança Pública que surgiram pelo país.

ADRIANI.                                    Major PM Piloto Policial de Helicóptero e Comandante da BRPAe Praia Grande.

Técnicas e equipamentos que, na sua maioria, dependem do uso de cordas específicas de Salvamento em Altura.

Em função disso as tripulações perceberam a necessidade de trazer de volta à cena o Guincho Elétrico, bem como da aquisição de novos equipamentos, os quais são utilizados com muito sucesso por unidades aéreas de outros países, mas que não se tornaram ainda um padrão no Brasil, em virtude das limitações encontradas nos helicópteros mencionados e na pequena frota de aeronaves biturbina dos estados que executam ações de segurança pública e defesa civil.

A BRPAE Praia Grande

Desde a sua inauguração em 2005 a Base de Radiopatrulha Aérea  (BRPAe) de Praia Grande contabiliza uma demanda considerável no atendimento de ocorrências em região de mata, principalmente da Serra do Mar. Nesse contexto o que impressiona é o aumento no número de vítimas salvas pelo helicóptero, que vem crescendo em escala nos últimos dez anos, de acordo com as estatísticas do GRPAe.

Segundo a Divisão de Operações, apenas a Base de Praia Grande atendeu em 12 anos de operação mais de 90 (noventa) missões de salvamento em matas e encostas, que são catalogadas como busca e salvamento terrestre. De janeiro de 2006 a dezembro de 2012 foram mais de 250 (duzentas e cinquenta) pessoas retiradas da mata com o auxílio do helicóptero Águia na região da Serra do Mar e Vale do Ribeira, no estado de São Paulo.

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O cenário do salvamento

Para essas operações de salvamento, o que impressiona é a dificuldade de acesso, visto tratar-se de área restrita para a aproximação da aeronave. Nesses locais de salvamento verifica-se um padrão de vegetação predominante da Serra do Mar. Nos locais onde as vítimas se perdem das trilhas, observam-se árvores de grande porte, com cerca de quinze a vinte metros de altura, com suas copas frondosas, que dificultam, durante o voo, a visualização do solo e das pessoas abaixo; exceto em locais próximos aos riachos e cachoeiras. Essas árvores tornam-se grandes obstáculos naturais para a tripulação durante toda a operação de busca e principalmente durante o salvamento.

Uma cadeia montanhosa que se estende por 1.500 quilômetros ao longo do litoral de quatro estados: Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná até o norte de Santa Catarina. Uma área de aproximadamente 315.000 hectares, que se estende desde o município de Itariri, ao sul, até Ubatuba ao norte, que é administrado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, por meio da Fundação Florestal. O Parque Estadual da Serra do Mar está dividido administrativamente em nove núcleos, cada qual com suas peculiaridades e diversidade de problemas relacionados com a degradação do meio ambiente.

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O relevo da Serra do Mar se apresenta como um dos aspectos mais importantes da região e que proporciona a presença de inúmeras cachoeiras e quedas d’água que atraem aventureiros de toda a sorte.

Contudo, por ser uma cadeia montanhosa, apresenta também aspectos que dificultam sobremaneira uma operação de busca para equipes terrestres, que se deslocam pelo terreno altamente acidentado. Em alguns locais o desnível é intenso o bastante para exigir técnicas de progressão com o auxílio de cordas como único recurso possível, ou o emprego do helicóptero, quando é acionado para apoiar na varredura desses locais de difícil acesso.

Se para equipes de busca o relevo se torna um dos maiores obstáculos, o que dizer das pessoas que se perdem nessas regiões, sem qualquer preparo ou conhecimento para agir em situações de emergência.

Dificuldades enfrentadas

Durante 34 anos de operação os profissionais de salvamento das aeronaves do GRPAe procuraram se adequar às principais dificuldades, barreiras e obstáculos encontrados nas ocorrências de salvamento em matas.

A adequação mais marcante se concretiza no desenvolvimento de equipamentos muito úteis, versáteis, que se tornaram referência para outras unidades com o passar do tempo, como o Cesto e o Puçá (rede utilizada para salvamento aquático).

Procurou-se esclarecer e conscientizar essas tripulações de que, mesmo com toda a utilidade e versatilidade, as atuais aeronaves e os equipamentos desenvolvidos durante esse tempo necessitavam se adequar e se adaptar com as novas realidades e tecnologias modernas, que estão à disposição de todos no mercado.

Outra questão importante tratada naquela pesquisa eram as técnicas predominantes no Grupamento de Radiopatrulha Aérea “João Negrão”, que não eram encaradas, pelos operacionais da base, como ideais sob o ponto de vista da segurança de voo. São téc nicas relacionadas com o uso de cordas de salvamento e acessórios metálicos. Em que pese tratar-se de equipamentos de alta qualidade e resistência, de acordo com os melhores padrões de especificação e certificação internacionais, sabia-se que o Guincho Elétrico era uma opção a ser considerada. No entanto, a unidade não estava mais o operando há décadas por uma série de questões.

Pretendeu-se naquele trabalho alertar para que não se esperasse um próximo acidente fatal com a técnica conhecida como Mc Guire no GRPAe, assim como em nenhuma unidade de Aviação de Segurança Pública e Defesa Civil no Brasil, já que existem técnicas, aeronaves e equipamentos que reduzem esse risco, ou o eliminam por completo.

Outro alerta do estudo foi que as ocorrências de pessoas perdidas na Serra do Mar continuariam aumentando e o atendimento por parte do GRPAe continuaria à medida que as unidades especializadas solicitassem o apoio da aeronave. Dessa forma o investimento em trazer o Guincho Elétrico de volta tornava-se plenamente justificável.

Parcerias no desenvolvimento

Ao longo dos anos, o comando do GRPAe procurou parceiros no desenvolvimento e nas pesquisas. As parcerias desenvolvidas no segmento de formação e capacitação com outras organizações, públicas ou privadas, representam um grande avanço na preparação de pilotos e tripulantes do GRPAe, para as ocorrências de salvamento em matas.

Um bom exemplo ocorreu com o Comando de Aviação do Exército (CAvEx), o qual possui um campo vasto para parcerias que podem ser desenvolvidas com a Polícia Militar. Na área de ensino, o Centro de Instrução de Aviação do Exército procura atender às solicitações que lhe são enviadas e, na medida do possível, desenvolver estágios específicos para a Polícia Militar.ilovepdf_com-101

Em dezembro de 2012, dez componentes do GRPAe, dentre os quais 01 piloto, 04 tripulantes e 05 mecânicos, frequentaram um Estágio de Operação do Guincho Elétrico, realizado no CAvEx na cidade de Taubaté –SP.

Foram 03 dias de intensas instruções sobre a manutenção e operação do equipamento, que foi concluído com uma instrução prática em voo, com o modelo FENNEC, em que todos os participantes tiveram a oportunidade de operar o guincho da aeronave, realizando com sucesso o içamento de carga inerte para o interior da cabine numa região de mata.

Esse estágio se realizou por meio de um plano de cooperação de instrução, por iniciativa da BRPAe Praia Grande, a fim de motivar tecnicamente os seus operadores. O que não deixou dúvidas sobre a sua eficiência ao término, pois todos concluíram pela aprovação do equipamento e concordância sobre a necessidade do GRPAe adquiri-los e reativá-los tão logo fosse possível.

O guincho elétrico de volta à cena

em 2017 o GRPAe iniciou uma série de testes e treinamentos de padronização com as equipes, visando a volta do guincho ao cenário de salvamento em matas. Foram utilizados dois equipamentos adquiridos juntamente com os Águias 22 e 23, as mais recentes aeronaves Esquilo da unidade. Nesses testes o comando procurou aproveitar aquela pesquisa de 2013 e adequou o procedimento operacional padrão – POP, em consonância com as necessidades atuais.

Finalmente em 2018, após a padronização de todos os pilotos e tripulantes operacionais das Bases de São Paulo e de Praia Grande, a operação com o guincho teve seu retorno formal no GRPAe, com esses dois equipamentos disponíveis.

Logo na primeira semana, no dia 29 de abril de 2018, foi utilizado com muito sucesso no salvamento de duas pessoas perdidas na Serra do Mar. E assim se sucederam mais e mais operações, como de fato se esperava.

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O feedback dos operacionais foi extremamente positivo, já que não houve nenhum reporte de pane ou baixa, exceto para realização da manutenção obrigatória de 50 ciclos ou 06 meses.

Uma das recentes ocorrências atendidas, que marcou positivamente o desempenho do guincho na Base Praia Grande foi no dia 30 de junho de 2018, durante o salvamento de um rapaz na região de Cubatão, próximo ao Rio Perequê.

A vítima caminhava por uma trilha na mata e sofreu uma queda, lesionando o seu tornozelo, impossibilitando-o de prosseguir. Era um local de difícil acesso, como sempre, e as equipes de bombeiros solicitaram o apoio da aeronave Águia 14. Assim que o tripulante operacional desceu pelo guincho até o local onde a vítima se encontrava, foi verificado que ele pesava aproximadamente 130 kg, o que aproximou do limite de carga do guincho, que é de 136 kg. Contudo toda a operação foi executada conforme os treinamentos, e o içamento do rapaz foi realizado normalmente, seguindo o padrão do equipamento.

Havia um certo desconforto sobre essa questão da limitação de carga, no entanto, com esse episódio, as dúvidas que ainda restavam foram totalmente dirimidas, e a certeza de que o guincho pode ser encarado como uma primeira opção no atendimento foi confirmada com sucesso.

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Sabe-se que todo equipamento é suscetível de falhas, assim como toda máquina tem sua vida útil, da mesma forma que as equipes têm plena consciência que o guincho possui também suas desvantagens.

Portanto, as demais técnicas de salvamento com uso de cordas, com carga externa viva, como o Rapel e Mac Guire não serão extintas e continuarão sendo exaustivamente treinadas, em conformidade com a doutrina da unidade, contudo, na BRPAe Praia Grande essas serão técnicas utilizadas como segunda opção, para quando o guincho elétrico não for viável ou estiver indisponível.

A evolução das técnicas e equipamentos devem ser encaradas como necessidade da organização, propiciando um clima de profissionalismo saudável entre seus membros, fomentando a pesquisa e o desenvolvimento.

Durante os últimos sete anos, buscaram-se pesquisas bibliográficas, literaturas sobre o assunto, questionários, testes realizados com novos equipamentos e entrevistas em unidades de aviação de outros estados, que culminou com a volta das operações com o guincho ao GRPAe.

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No futuro espera-se a aquisição de um guincho elétrico com especificação de 500 libras, com maior capacidade de carga, ou seja, 230 kg, possibilitando o içamento de um tripulante e uma vítima ao mesmo tempo, projetado para os helicópteros “Esquilo” AS350B2 e AS350B3. Um equipamento que já foi adquirido por outras unidades aéreas no Brasil e vem sendo utilizado com sucesso.

Enquanto isso, estudos com essa finalidade continuarão sendo elaborados na Base Praia Grande, já que até o momento obtiveram-se como resultados reais, a melhoria no atendimento das vítimas e a minimização dos riscos a que ficam expostas as tripulações envolvidas.

Da mesma forma acredita-se conclusivamente que aumentou o nível de segurança de voo das operações. E espera-se que no futuro ocorrerá gradativamente uma mudança nos indicadores de qualidade e uma redução do custo operacional das operações de salvamento em matas no GRPAe.

Fonte: Revista “O Águia” – 4ª Edição