Espírito Santo – Caiu a noite em Vitória e um grupo tático da Polícia Militar entrou em operação no bairro Joana Darc. Nada parecia fora da rotina de policiamento, mas o diferencial estava no alto, entre 1.000 e 1.500 metros de altura. No helicóptero, um equipamento operado pelo Núcleo de Operações e Transporte Aéreo (Notaer) via o que militares em terra ou no ar não poderiam enxergar, com detalhes capazes de revelar se uma pessoa está com um celular, com uma arma na mão ou até mesmo um cigarro aceso.


Vídeo: Fotografando Heróis

O flagrante acima foi acompanhado por uma equipe de reportagem que realizou um sobrevoo pela capital com o novo Imageador Térmico adquirido há cerca de seis meses pelo governo do Espírito Santo, demonstrando suas possibilidades de uso.

O sistema é composto por uma câmera de alta capacidade de imagem, interligada a um software inteligente que potencializa a função da lente. Realiza leitura de temperatura, coordenação em tempo real, distribuição de telas, comandos por aplicativo e recebimento de imagens pelo celular, via internet 4g e rádio.

O investimento foi de R$ 14 milhões, sendo que, apenas a câmera de tecnologia canadense, custa em média R$ 10 milhões.

Quando um helicóptero voa sem a câmera, todas as funcionalidades da tripulação são relacionadas à visão da equipe. Já com o sistema, foi aprimorada a capacidade de localizar alvos. A lógica não é ser vetor da ocorrência, mas plataforma de observação. Os tripulantes conseguem aumentar a sua capacidade de visualização e ainda transmitir em tempo real o que está sendo capturado”, detalhou o piloto do Notaer, Major Wellington Luiz Kunsch.

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Conforme o Notaer, 90% do sistema já está operando. É preciso ainda acabar de implementar a transmissão por radiofrequência e interligar sistemas, como o de reconhecimento facial e o Cerco Inteligente.

Mesmo em fase de aprimoraram, foram cerca de 30 operações programadas com o uso do Imageador Térmico, que já auxiliou com o mapeamento de informações para investigações relacionadas ao tráfico de drogas.

Sensor térmico

A capacidade de identificação térmica do equipamento é o seu maior diferencial em relação a outras possibilidades testadas e utilizadas no estado. Isso significa, que, durante o uso, mesmo à noite, os operadores de voo conseguem identificar alvos a partir da sua temperatura.

“As imagens podem ser capturadas e exibidas coloridas ou pelo infravermelho, baseado em comprimentos de ondas de calor, ou ainda as duas formas de maneira conjugada. Neste caso, se tira o cenário colorido, mas ficam os contornos de casas, veículos, pessoas, objetos, conforme a sua temperatura”, explicou.

“A equipe pode estar voando em um breu total, ainda assim o infravermelho consegue trazer a imagem com base nessa diferenciação termal”, complementou.

“Uma arma que acabou de ser utilizada fica aquecida, ou seja, é possível identificar uma arma recém utilizada e abandonada por criminosos, jogada em uma mata, ou ainda nas mãos de uma pessoa.”

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Na imagem acima, a luz flagrada na mão de um homem, que é levada a boca e depois passada para a outra mão, indica um cigarro aceso.

Operador de voos do Notaer há 5 anos, Cabo Pêgo baliza e passa informações para o piloto durante um voo. Para ele, contar com essa tecnologia é uma mudança de processo e uma garantia de segurança, por via uma visão mais ampla e visualização da vulnerabilidade do terreno.

Na prática, o operador vai na parte de trás da aeronave, controlando duas telas touch e utilizando uma espécie de controle remoto.

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A gente estava acostumado com a atividade fim, o resgate, o policiamento raiz com voo baixo. E aí agora a gente tá voando mais alto, usando tecnologia […] Agora temos mais segurança, o voo é mais seguro”, relatou o Pêgo.

Além do operador no helicóptero, uma segunda pessoa fica em solo analisando as imagens, uma complementa o trabalho da outra, para nenhum detalhe ser perdido.

Diminuição de confrontos

Ainda sobre a lógica de se transformar o helicóptero em uma plataforma de observação, o major Kunsch explicou que essa prática permite o mapeamento de atividades criminosas e a antecipação das ações policiais.

“Mapear o terreno e identificar minimamente as pessoas que estão ali, significa pegar o indivíduo de surpresa e orientar ações de policiais. Se eu consigo transmitir para o policial com dois, três, cinco minutos de antecedência, eu ajudo no planejamento e minimizo os confrontos armados e possíveis vítimas”, disse.

“Por exemplo, se a gente localiza o alvo dos policiais e localiza que um grupo de crianças brinca no caminho por onde é preciso passar para chegar até ele, estamos falando de uma ação mais planejada e segura. Essa é a lógica da informação, evitando o resultado indesejado”

O Imageador Térmico é utilizado em outros países, por equipes policiais, como nos Estados Unidos.

“Queremos sair da lógica do rasante, não tem lógica colocar um helicóptero numa cena de confronto. Não tem mais atirador pendurado na porta aberta”
“Precisamos olhar para outros países e entender como foi a evolução. Em Los Angeles, a polícia voa horas seguidas só com o imageador e a porta fechada. Quem atuará é a tropa que está no chão”, falou o major.

O sistema em números:

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Recurso não substitui drone
O mesmo monitoramento realizado por um drone em um dia, pode ser feito pelo helicóptero com o Imageador Térmico em 2 horas. Entretanto, a ideia não é substituir um pelo outro, mas complementar, mantendo o drone em atividades pontuais, voos de observação rápidos, com altitude determinada e tempo de operação reduzido.

Em relação à segurança de operadores, pilotos e aeronaves, a câmera térmica consegue trabalhar a uma distância muito além de 1.500 metros. Atualmente, nenhum calibre de armamento que já se viu operar no Brasil tem capacidade de chegar a essa distância, atirando para cima.

Ou seja, o helicóptero fica longe o suficiente do ponto de atuação, dependendo do caso, de maneira discreta e não identificada.

Uso vai além de operações policiais!

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Por mais que a utilização do Imageador Térmico seja primeiramente relacionada a ações policiais, o emprego não é exclusivo. O equipamento pode ser aliado em ocorrências de salvamento, em montanhas e no mar, mapeamento de áreas isoladas, monitoramento de incêndios, acompanhamento de aglomerações, entre outros.

“Imagine uma pessoa perdida no Mestre Álvaro. Com a câmera, o helicóptero poderá voar à noite, antecipando 6h, 8h nas buscas que até então não poderiam ser feitas sem iluminação, porque nada seria visto a olho nu no meio da mata”, exemplificou Cabo Pêgo.

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Uma equipe do Notaer acabou de chegar do Rio Grande do Sul, onde auxiliou nas questões logísticas e de segurança, como direcionamento de tropas e policiamento ostensivo, em ações necessárias após o desastre provocado pelas chuvas.

As equipes em solo, muitas de outros estados, sem conhecimento prévio da região, acessavam o aplicativo interligado ao sistema, abriam um mapa da cidade, e os capixabas no helicóptero conseguiam ver onde as viaturas estavam rodando. Também foi dado apoio a embarcações em áreas alagadas.

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No Espírito Santo, o equipamento também foi utilizado em Mimoso do Sul, após a forte chuva que atingiu a cidade no mês de março, para monitoramento de áreas bloqueadas, mapeamento de queda de barreiras, alinhamento com planilhas dos bombeiros para traçar locais que eram prioridade de envio de recursos.

Também foram passados dados ao Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) para poder ser feito um documento completo das áreas, estradas e estabelecimentos afetados na região.

Atualmente, a operação de um sistema como o adquirido no estado, com câmera de quinta geração, só é feita no Rio de Janeiro e no Paraná. Entretanto, até o momento, o funcionamento de maneira integrada, operando à disposição das Polícias Militar e Civil e Bombeiros, só acontece no Espírito Santo.

Vídeo e fotos: Fotografando Heróis