Coordenação Operacional embarcada em helicóptero
21 de outubro de 2015 8min de leitura
Major PM OSCAR FERREIRA DO CARMO
Grupamento de Radiopatrulha Aérea da PMESP
Comandante da BRPAe Ribeirão Preto
A velocidade das informações no mundo contemporâneo, advinda de pesquisas e inovações tecnológicas, tem proporcionado transformações na sociedade, na economia, no ensino e em diversas outras atividades, exigindo das instituições habilidades para desenvolver novas técnicas e adaptar seus produtos e serviços às novas exigências, sempre pensando na eficiência e eficácia, com geração de valor ao usuário.
A dificuldade de previsão do futuro, as mudanças sociais, as incertezas no mundo econômico e político, formam um cenário ideal para o desencadeamento de crises de toda ordem. Com as crises evoluem os conflitos, o recrudescimento do crime, as ocupações desordenadas do espaço e, por consequência, as demandas junto ao Poder Público.
Ações de pequeno porte adquirem repercussão política e divulgação na mídia internacional, o chamado ‘efeito CNN 1 , o que torna ultrapassada a rígida compartimentação dos níveis decisórios das organizações (VISACRO, 2015).
Diante do aumento da complexidade operacional na década passada, as Polícias rapidamente buscam ajustar funções e níveis de comando para fazer frente aos óbices da segurança pública. Um exemplo da Polícia Militar do Estado de São Paulo foi a criação da coordenação operacional 2.
As Polícias também acompanham o desenvolvimento tecnológico, a exemplo das informações sobre o posicionamento de guarnições policiais, comunicação digital, soluções de monitorização por câmeras terrestres e imageadores embarcados em helicópteros e veículos, e modernos centros de operação. Muitas iniciativas têm sido apoiadas por verbas federais, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP).
O aperfeiçoamento dos sistemas de comando e controle (C2), a redução de ciclos decisórios com a delegação de competência, autonomia e liberdade de ação, a diminuição da tendência ao microgerenciamento , tudo isso com o suporte de tecnologias de informação (TI) adequadas, deve ser a meta dos comandos modernos (VISACRO, 2015).
Segundo Scachetti Jr (2014), o C2 melhora o processo decisório, possibilitando a tomada de decisão mais acertada e oportuna. Há necessidade de estrutura de apoio (o controle) para possibilitar ao comando uma visão clara e real da situação e do cenário, assim como dos recursos à sua disposição.
Visacro (2015) defende a filosofia de Mission Command, introduzida recentemente na doutrina do Exército dos Estados Unidos e sugere a redenção dos aspectos humanos e organizacionais na função de comando e controle (C2), pois são “exigidos para a condução eficaz das operações […] e o pleno exercício do comando por líderes capazes, em todos os níveis hierárquicos, numa era caracterizada por ambientes voláteis, incertos, complexos e ambíguos”.
Se tecnologia por si só não é capaz de dirimir conflitos ou tomar decisões que irão impactar na resolução deles ou nas ações da Polícia, pode sim, ser um excelente elemento facilitador. O próprio Visacro (2015) admite que “o cerne do problema não se encontra no célere, irreversível e imprescindível […] incorporação de novas tecnologias […] Está no uso que se pretende dar a essa tecnologia e, sobretudo, no tipo de homem que irá empregá-la”.
Ampliar a capacidade de coordenação operacional parece fundamental diante das adversidades interpostas aos comandantes. A coordenação operacional em grandes operações, em ações táticas especiais ou mesmo em ocorrências locais de alta complexidade, pode exigir dos comandantes, visão panorâmica e capacidade de mobilizar veículos, patrulhas e equipamentos.
A consciência situacional e o processo decisório, imunes ao microgerenciamento 3, sugerem facilitar o trabalho de comando e controle, além de permitir aos escalões subordinados uma autonomia maior, sem se perder a intenção do comando.
Assim, tendo como referência o exército dos Estados Unidos da América, cuja expertise em ações de combate é inquestionável, inovou com o uso de helicópteros como posto de comando na Guerra do Vietnam, em 1963, fato ampliou a capacidade de gerenciar todo o contexto da batalha e não tolheu a iniciativa dos oficiais subordinados em terra (DUNSTAN, 2003).
O deficiente planejamento de integração é relatado em diversas operações militares (TAYLOR, 2015), mas também ocorre quando interagem modalidades diferentes da PMESP, inclusive com as operações aéreas.
Segundo Taylor (2015) “os comandantes conhecem as vantagens que o apoio aéreo pode proporcionar […], mas deixam de incluir os fundamentos da coordenação com as unidades aéreas no adestramento de suas unidades”, dessa forma, a falta de familiaridade e integração leva ao comprometimento da missão e resultados abaixo do esperado.
Utilizando como referência o exército dos Estados Unidos da América, o mais poderoso e experiente do mundo contemporâneo, desde a Guerra do Vietnã (KEITHLY; FEBBRIS, 2000; DUNSTAN, 2003), passando pelas batalhas na Somália, retratadas por Bowden (2010) no livro e filme de mesmo nome, “Black Hawk Down”, operações de guerra e contra guerrilha urbana no Iraque (A2C2S…, 2003) e no Afeganistão, além de ações de tropas especiais combinadas com a Agência de Inteligência Central americana (Central Intelligence Agency – CIA), foram utilizados postos de comando aéreos.
O EUA usam modernos sistemas de comando e controle embarcados em aeronaves, como o Army Airborne Command & Control System (A2C2S), formados por cinco estações de trabalho, com sistemas militares de comando e controle, inteligência, defesa eletrônica e aérea, comunicações e apoio de fogo, embarcados em um helicóptero Sikorsky Black Hawk.
Usados na Operação Liberdade no Iraque, segundo a fabricante (Raytheon Co.) o sistema foi testado para uso civil da Guarda Nacional americana e defesa civil na coordenação de catástrofes, tais como a destruição por furacões e tornados e na proteção de fronteiras e defesa nacional (homeland security) (A2C2S…, 2003).
Como nota, os últimos conceitos de tecnologia de comando e controle, evolução de C2, são os C4ISTAR (da sigla em inglês que designa comando, controle, comunicações, computador, inteligência, vigilância, aquisição de alvos e reconhecimento).
Guardadas as devidas proporções, podem-se vislumbrar situações na realidade operacional das Polícias no Brasil onde caberia tal inovação.
Deve-se considerar a pesquisa do conceito de comando e controle (C2), num modelo com o coordenador operacional e parte do Estado Maior embarcados, tomando as decisões com o aporte de um sistema semelhante em aeronave de médio porte e tecnologia acessível (imageador infravermelho, comunicação, georeferenciamento de patrulhas, veículos, moving maps).
A visão panorâmica permite o sincronismo das ações em eventos complexos, operações em áreas de interesse da segurança pública (AISP), como as favelas,e também em cercos, rebeliões, reintegrações de posse, catástrofes, eventos esportivos.
Aliar o elemento humano e aspectos organizacionais a mais moderna tecnologia depende de capacitação dos profissionais, da adequação da tecnologia e de um método facilitador, no qual a disciplina de Gestão de Processos pode ser sendo introduzida (ABPMP, 2013). A capacitação pode ser desenvolvida por simuladores.
Diversas vantagens concorrem para a conveniência da coordenação operacional embarcada em helicóptero, entre eles:
1) o comando direto com auxílio das comunicações, menor tendência de microgerenciamento;
2) a visão panorâmica das equipes policiais e sua evolução no terreno, visão ampliada com equipamentos infravermelhos, de imagem e de georreferenciamento;
3) ter a assessoria direta do EM embarcado (operações e inteligência, pelo menos);
4) a vantagem do emprego de helicóptero multiuso de médio porte, com tecnologia adequada em kits de fácil montagem e remoção, próprias para esse tipo de missão e a inovação do modelo de C2 em termos de Polícia.
NOTAS
[1] Referindo-se à emissora de televisão norte-americana.
[2] Para fins desse artigo a função de coordenação operacional será considerada uma função de comando, podendo ser assumida no teatro de operações por Oficial Superior de qualquer patente, conforme a complexidade da intervenção. Na PMESP é uma função exercida por um Coronel com visão estratégica para toda a Corporação e por Major nos batalhões, mesclando a estratégia local com forte presença tática.
[3] O microgerenciamento é um estilo de gestão em que o gerente exerce um controle excessivo sobre o trabalho de sua equipe, envolvendo-se demasiadamente com os detalhes de cada tarefa (SIQUEIRA, 2010).
REFERÊNCIAS
A2C2S Supports Troops in Iraq with Combat Command and Control. Defense-Aerospace. Neuilly Sur Seine (France). Edição do dia 31/10/2003. Disponível em:< http://www.defense-aerospace.com/articles-view/release/3/28091/us-army-tests-airborne-c2-in-iraq-(oct.-31).html>. Acesso em 27 Ago, 2015.
ASSOCIATION OF BUSINESS PROCESS MANAGEMENT PROFESSIONALS (ABPMP). BPM CBOK: Guia para o Gerenciamento de Processos de Negócio, Corpo Comum de Conhecimento, ABPMP CBOK V 3.0, 1ª Ed., 2013.
BOWDEN, M. Black Hawk Down: a story of modern war. New York: Groove Press. 2010.
DUNSTAN, S. Vietnam Choppers: Helicopters in Battle 1950-1975. Oxford: Osprey Publishing, 2003.
KEITHLY, D. M.; FERRIS, S. Auftragstakitk, ou Controle Diretivo, em Operações Conjuntas, Combinadas e Interaliadas. Military Review, Edição Brasileira, 2º Quad, 2000, p. 24 e 25.
SCACHETTI JR, P. L. Sistema de comando e controle: análise conceitual e perspectiva de utilização conjunta pela Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil do Estado de São Paulo. São Paulo: Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores. PMESP. 2014.
SIQUEIRA, J. Micro gerenciamento: como se livrar da obsessão pelo controle excessivo. Disponível em:<http://criatividadeaplicada.com/2010/03/28/micro-gerenciamento-como-se-livrar-da-obsessao-pelo-controle-excessivo/>. Acesso em 18 Ago, 2015.
TAYLOR, R. Planejamento e Integração nas Operações Aeromóveis. Doutrina Militar Terrestre em Revista, 7ª Ed., 2015, p. 48-57. Disponível em:< http://www.cdoutex.eb.mil.br/index.php?option=com_wrapper&view=wrapper&Itemid=1196>. Acesso em 18 Ago, 2015.
VISACRO, A. Superando o Caos: a função de combate comando e controle além da Tecnologia da Informação. Military Review, Edição Brasileira, Julho-Agosto, 2015, p. 70-88. Disponível em:<http://www.joomag.com/magazine/military-review-edi%C3%A7%C3%A3o-brasileira-julho-agosto-2015/0483313001434382791>. Acesso em 18 Ago, 2015.
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