Família de policial que caiu de helicóptero há três anos ainda luta por indenização
27 de novembro de 2016 3min de leitura
27 de novembro de 2016 3min de leitura
Rio de Janeiro – Com olhos verdes bem abertos, deitado em uma cama hospitalar em seu apartamento, Claudio Cobo assiste em silêncio ao vaivém de técnicos de enfermagem, fisioterapeuta e fonoaudióloga. Uma vez por mês, recebe a visita de um médico. A cada 15 dias, uma enfermeira vai vê-lo. Mas ninguém da equipe médica sabe ao certo seu nível de compreensão do que se passa ao redor desde o dia 2 de maio de 2013, quando o policial civil sofreu um acidente de helicóptero que o transformou para sempre.
Claudio não fala desde então. Não consegue comer sozinho, nem tomar banho, nem se vestir. Há três anos e meio, era forte, pesava 83kg e havia acabado de concluir um curso de piloto. Mudou-se com a mulher, Darlene Vieira, uma filha e duas enteadas para o Recreio — surfista de ondas grandes, queria morar perto do mar. Após o acidente, durante um exercício do Serviço Aeropolicial da Polícia Civil (Saer), no campo de treino do Caju, seu corpo ficou franzino, 20 quilos mais leve. Sua dependência é total. O abandono do estado, também.
— Até hoje não recebemos um real de indenização. O pior de tudo foi descobrir que a seguradora contratada pelo estado (a NOBRE) para os servidores da segurança foi à falência mês passado — afirma Darlene, de 47 anos, mulher de Claudio há 19. — Tive que abandonar minha carreira para cuidar do meu marido, mas contamos com a ajuda de amigos policiais para comprar fraldas. É um leão por dia.
COMUNICAÇÃO COM UM DEDO
Desde a queda de um helicóptero da Polícia Militar, Claudio não tira os olhos da televisão quando o noticiário traz novidades sobre o caso. O que deve pensar? Respondendo “sim” e “não” com o dedo, já mostrou ser capaz de fazer contas e, num exercício de inglês, surpreendeu a todos ao provar que ainda lembra alguma coisa do idioma. Um passo gigantesco para quem, segundo médicos que o atenderam, ficaria para sempre em estado vegetativo.
Mas a falta de recursos o impede de evoluir mais. Claudio deveria fazer um tipo de fisioterapia que estimula todas as áreas do cérebro, afetado em diferentes pontos por uma lesão axonal difusa — ele ficou pendurado pelo cinto enquanto o helicóptero girava, antes de cair. Cada sessão, no entanto, custa quase R$ 300. Colegas da Polícia Civil chegaram a organizar uma campanha de doação, mas o tratamento teve que ser interrompido ainda em 2013.
O descaso vem também do CENIPA, da Aeronáutica, que, agora, está investigando a causa da queda do helicóptero na Cidade de Deus. Até agora o relatório final do acidente de Claudio não ficou pronto. Se não fosse o plano de saúde da empresa de segurança Forseg, onde ele também trabalhava, o policial não estaria recebendo qualquer tipo de assistência — muito menos o home care, conseguido pela família por meio de uma liminar quando a operadora de saúde tentou cancelar o tratamento.
— É uma luta contra o esquecimento — resume o advogado Marcos Costa Borges. — O valor da indenização já havia sido definido. Foi uma longa negociação. Esperávamos a assinatura do contrato quando a empresa faliu.
Procurado, o liquidante da Nobre Seguradora, Pedro Paulo Pereira Mota, não retornou as ligações. A Polícia Civil não se pronunciou. Segundo o presidente do sindicato da corporação (SinPol), Fernando Bandeira, há pelo menos mais 13 policiais na mesma situação de Claudio, à espera de indenização.
— Estou ligando quase todos os dias para marcar uma audiência com o novo chefe de Polícia Civil, Carlos Leba. Não consigo espaço na agenda dele — diz Bandeira. — Nossos companheiros já vivem desprotegidos.
Darlene nunca fez terapia, mas descobriu que precisa se manter forte e, por isso, aprendeu a reservar uma hora por dia para se cuidar — passou a correr no Recreio e medita. Quem a ajuda são as duas filhas, de 24 e 20 anos, que veem Claudio como pai. As duas filhas biológicas do policial se afastaram. Dizem que não aguentam vê-lo na cama.
— Claudio foi muito bom para mim. Sinto saudade do meu marido, meu amigo, meu conselheiro — diz Darlene.
No próximo sábado, ele completará 46 anos. No aniversário do ano passado, policiais do Saer passaram de helicóptero em cima de sua janela. Claudio sorriu.
Fonte: O Globo, por Caio Barreto Briso.
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