Laudo aponta falha humana em acidente com helicóptero do CIOPAer
14 de julho de 2009 7min de leitura
14 de julho de 2009 7min de leitura
No dia em que completam dois anos do acidente com o helicóptero ´Águia 04´ do Centro Integrado de Operações Aéreas (Ciopaer), que resultou em três tripulantes mortos e dois feridos graves, o Diário do Nordeste divulga, com exclusividade, o laudo final das investigações sobre o desastre aéreo. Um documento escrito em 18 páginas, assinado por dois oficiais do Estado-Maior da Aeronáutica, aponta que a queda da aeronave foi causada por falha humana. O piloto, conforme os especialistas, realizou uma manobra errada no momento do pouso, inclinando o helicóptero a um nível que provocou ´perda de controle de vôo”. O documento não cita nomes.
“O perfil (inclinação lateral) empregado extrapolou a capacidade de manobra da aeronave, provocando perda de controle de vôo próximo do solo”, revela o laudo assinado pelo brigadeiro-do-ar Jorge Kersul Filho, chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa); e pelo tenente-brigadeiro-do-ar, José Américo dos Santos, oficial chefe do Estado-Maior da Aeronáutica (Emaer).
Investigação
O laudo foi concluído no dia 8 de agosto último – exatos um ano e oito meses depois do acidente – mas foi mantido em sigilo. Ontem, o Diário obteve uma cópia do documento.
Durante as investigações, os peritos do Cenipa afastaram a hipótese de falha mecânica. Concluíram que a aeronave – de marca Esquilo, modelo AS-350 B2, fabricada em 2001, com 1.679 horas voadas – não apresentava nenhum defeito. Estava com seu certificado de navegabilidade válido e havia sido submetida a uma recente revisão geral. As cadenetas de vôo estavam atualizadas. ´Conforme análise dos destroços, todos os sistemas da aeronave apresentavam funcionamento normal até o momento da colisão no solo´, atestam os peritos.
Os técnicos também descartaram outros fatores para o acidente, como condições climáticas. “A tripulação estava ciente das condições meteorológicas da região. A visibilidade era maior ou igual a 10 metros e o teto não impossibilitava a operação de tráfego padrão para helicópteros”, diz o laudo.
Manobra
O laudo do Cenipa revela ainda que, antes da manobra final que resultou na tragédia, o piloto tentou um primeiro pouso, mas teve que arremeter no ar, ´com curva para a esquerda, ingressando num tráfego encurtado.´ O histórico do acidente é assim descrito: ´Neste segundo tráfego (manobra), executado a um altura aproximada de 150 pés, ao final da curva base, a aeronave encontrava-se em curva para a esquerda, com elevado grau de inclinação quando, repentinamente, perdeu altura e, mantendo a inclinação lateral, veio a colidir com o terreno.´
Dos cinco tripulantes, três tiveram morte imediata. Eram o major PM Lindemberg Antônio Austregésilo de Andrade (piloto), a major BM Rosana Buson Pompeu de Sousa Brasil e o soldado PM Roberto Pacheco da Costa. Ficaram feridos o sargento PM Burton Deyves Gomes de Araújo e o sargento BM José Júnior Lopes da Silva (promovido a subtenente).
Dos dois feridos, apenas um deles está totalmente recuperado. Trata-se do sargento Burton. O subtenente Lopes hoje vive em estado vegetativo, conforme o Diário denunciou em matéria especial publicada na edição de ontem (28).
Lopes sofreu uma embolia e, desde então, não consegue mais falar nem andar. Vive acamado e sob os cuidados de sua esposa. Para complicar ainda mais a vida da família do militar, o governo cortou a gratificação que ele recebia.
PREVENÇÃO
Peritos explicam que documento não objetiva apontar culpado
O laudo elaborado pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), segundo os peritos, não tem por finalidade ´determinar culpa ou responsabilidade, mas, sim, exclusivamente, o de prevenir acidentes aeronáuticos. O relatório final é um documento técnico que reflete o ponto de vista do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer) em relação às circunstâncias que podem ter contribuído para a ocorrência, bem como, estabelece providências para a prevenção de futuras ocorrências (acidentes).”
Testemunhas
Além de fazer levantamentos técnicos sobre as condições da aeronave e de analisa as condições de vôo e sua realização, os peritos do Cenipa também tomaram o depoimento de testemunhas do desastre aéreo.
“Testemunhas citaram que o piloto teria perfeito domínio sobre a aeronave Esquilo, dada a ‘facilidade e habilidade’ com que conduzia o vôo, executando manobras não realizadas pelos demais. Era o piloto que contava com a maior quantidade de horas de vôo na organização e mantinha uma elevada disponibilidade para a atividade aérea”, relataram os peritos se referindo ao major Lindemberg Austregéslio de Andrade, que comandava o ‘Águia’.
CONSTATAÇÃO GRAVE
Descontrole dominava ações do Ciopaer
Em meio às conclusões sobre o desastre que matou três integrantes do Ciopaer, os peritos do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) fizeram duras críticas ao modo como o Ciopaer funcionava. Não havia, segundo os oficiais, nenhum controle de gerenciamento sobre as aeronaves e sua utilização em operações.
´Os pilotos da organização tinham como hábito realizar os treinamentos de formação e manutenção operacional, em geral, ao final de suas missões operacionais, por sua própria iniciativa, sem um escalação prévia ou seqüência padronizada. Seu desempenho também não era registrado pelo setor de operações”, diz o Cenipa.
Em outro trecho do laudo, os peritos são ainda mais contundentes sobre a desorganização que havia no Ciopaer à época do desastre. “O setor de operações do grupamento aéreo não mantinha um controle adequado do treinamento dos tripulantes. Os comandantes das aeronaves realizavam seus treinamentos em aproveitamento das missões operacionais, sem um devido controle.´
Desorganização
O laudo segue: ´Havia uma cultura informal na organização, que não incentivava a participação de todos os componentes em prol da operacionalidade e da segurança de vôo. Há indícios de que no grupamento aéreo não havia um ambiente adequado para que os demais membros da tripulação pudessem intervir na condução do vôo, de forma a manter o mesmo em elevada condição de segurança.´
De forma categórica, os peritos da Aeronáutica afirmaram que o desfecho trágico do acidente também ocorreu “em função da falta de acompanhamento e controle no desempenho das tripulações, propiciando comportamentos não padronizados e a inserção de uma cultura informal e não participativa no trato de assuntos de segurança de vôo.´
Como parte de sua função, o Cenipa colocou no laudo um elenco de recomendações para minimizar os riscos de um novo acidente com as aeronaves do Ciopaer. Entre as recomendações estão: ´Implementar um programa mínimo de manutenção operacional e reciclagens práticas e teóricas que atenda às necessidades de treinamento de todos os seus tripulantes.”
Outra recomendação é: ´Adotar uma metodologia para a execução, controle e supervisão do cumprimento do programa de manutenção operacional e reciclagens prática e teórica de todos os tripulantes da AS-350 (modelo das aeronaves da frota do Ciopaer).
Os peritos assinalam que, no dia 25 de agosto de 2006, foram encaminhadas à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social recomendações sobre segurança de vôo.
FIQUE POR DENTRO
Aeronave caiu quando retornava para o hangar
Era a tarde do dia 29 de dezembro de 2005, quando o helicóptero ´Águia 04´ do Centro Integrado de Operações Aéreas (Ciopaer) retornava para a base depois de mais um vôo de patrulhamento sobre Fortaleza. Horas antes, a equipe havia participado de uma operação exitosa na caça a assaltantes. Por volta das 16h030, a aeronave, comandada pelo major PM Lindemberg Austregésilo de Andrade (piloto), e pela major BM Rosana Buson Pompeu (co-piloto), se aproximava do hangar quando, de repente, despencou de uma altura aproximada de 300 metros. A aeronave não explodiu. Porém, ficou completamente destroçada.
Os dois oficiais tiveram morte imediata, assim como o soldado PM Roberto Pacheco da Costa. Gravemente feridos ficaram outros dois tripulantes: o sargento PM Burton Deyves Gomes de Araújo e o soldado BM José Júnior Lopes da Silva. O primeiro conseguiu se recuperar das lesões. Já o soldado Júnior, do Corpo de Bombeiros Militar, não teve a mesma sorte e hoje vive em estado vegetativo em sua residência. Durante quase dois anos, as autoridades mantiveram total silêncio sobre as causas do fato, que só vieram a tona agora, diante do trabalho de jornalismo investigativo da equipe do Diário. O silêncio das autoridades inquietava os familiares das vítima, bem como, os seus colegas de farda.
Fonte: Diário do Nordeste.
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