Seminário no DF amplia debate sobre a prevenção de acidentes aeronáuticos
06 de outubro de 2013 6min de leitura
06 de outubro de 2013 6min de leitura
Você sabe o que é ressonância solo? E a relação entre cultura organizacional e segurança de voo? Acha que é possível “flexibilizar” as regras do sistema de aviação sem sofrer um acidente e sem ter de prestar contas à Justiça? Conhece os detalhes do acidente da NoAR Linhas Aéreas, no Recife, em julho de 2011? Já ouviu falar no CRM aplicado à manutenção de aeronaves? Sabe como avaliar sua consciência situacional?
Os 78 profissionais de aviação que escolheram passar todo o sábado (28) discutindo prevenção de acidentes aeronáuticos sabem tudo isso e muito mais. Eles participaram do seminário promovido pelo Sexto Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SERIPA VI), desta vez em Samambaia/ Distrito Federal. Na plateia, profissionais de Goiás, Mato Grosso e até da Bolívia. Jovens em formação, pilotos experientes, mulheres, homens, civis e militares.
Os temas são variados, mas apontam para o mesmo caminho: é possível defender e implantar a segurança de voo nas organizações e empresas. Para isso, é responsabilidade de todos lutar pela sensibilização dos chefes e criar a cultura forte da prevenção. Os palestrantes que participaram do Seminário, com especialização, mestrado e cursos nos principais órgãos investigadores do exterior, permitiram um rico debate de ideias.
Os temas e seus desdobramentos
A segurança de voo é muito ampla. O homem é o principal ator da aviação, por isso, a psicologia está sempre nesses encontros, provocando reflexões e autocríticas. Como equilibrar o cumprimento da missão quase obrigatório e as limitações impostas pela segurança de voo? “A missão tem que ser cumprida, mas precisamos considerar os limites operacionais definidos pela empresa. Também não basta só definir limites, a empresa precisa cobrar o cumprimento das regras”, alerta a psicóloga Vanessa Dias, assessora técnica de Fatores Humanos do CENIPA.
Didáticos e atraentes, os estudos de casos são recheados de lições. O principal deles apresentado no seminário foi o acidente de 13 de julho de 2011, no Recife, com a aeronave LET 410, da NoAr Linhas Aéreos. Membro da comissão investigadora, o chefe do SERIPA VI, Tenente Coronel Aviador Marcio Vieira de Mattos, mostrou a sequencia dos fatores contribuintes e informou que, dois meses após o acidente, foram emitidas as primeiras Recomendações de Segurança de Voo.
“Eu já havia lido o Relatório Final desse acidente, mas ouvir a explicação é muito mais fácil de compreender. Foi a minha palestra preferida”, opina Ludmila Rodrigues, auxiliar da coordenação dos cursos de manutenção, pilotagem e comissaria do Aeroclube de Várzea Grande.
Os pilotos de helicóptero aprenderam a identificar três fenômenos particulares das aeronaves de asa rotativa. Depois da palestra do Capitão Aviador Thiago Lírio, do Esquadrão de Busca e Salvamento da FAB, foi possível entender os motivos pelos quais ocorrem Ressonância Solo, Rolamento Dinâmico e Stall de Vortex e como proceder em cada caso para não resultar em acidente aeronáutico.
Com mestrado em Segurança de Aviação e Aeronavegabilidade Continuada pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), ele alertou para o crescimento das operações de helicópteros no Brasil e o desafio de estabilizar ou reduzir a curva dos acidentes aeronáuticos nesse segmento da aviação.
A consciência situacional (percepção de um fato, compreensão no contexto e projeção das consequências) foi o tema apresentado pelo Capitão Aviador Elio Almeida Junior, do Grupo de Transporte Especial da FAB. “Reconhecer os sinais de alerta – estresse, inexperiência, fadiga, conflitos interpessoais – é o primeiro passo para se trabalhar na recuperação da consciência situacional”, explica o Capitão.
Pela experiência de mais de 40 anos na manutenção, o Tenente Coronel Especialista em Aeronaves, Jocelyn Santos dos Reis, foi convidado a dividir seu vasto conhecimento com o público do seminário. “Falar em prevenção na manutenção no Brasil é falar o nome do Tenente Coronel Reis”, afirmou o Chefe do SERIPA VI.
Entusiasta da prevenção, o Tenente Coronel Reis abriu a palestra com um provérbio árabe: “os homens são como tapetes; de vez em quando precisam ser sacudidos”, para exemplificar que o objetivo de discutir a prevenção em seminários é renovar a consciência situacional do público.
Segundo a doutrina do MRM (Maintenance Resource Management), toda possibilidade de falha pode ser gerenciada pelo debriefing/ feedback, tomada de decisões, consciência situacional, administração da tarefa, apoio mútuo, comunicação, planejamento.
À frente da Seção de Prevenção de Acidentes e tendo participado de diversas investigações conduzidas pelo SERIPA VI, o Major Aviador Sérgio Paiva assegura que tem sido claro o constante descumprimento de regras básicas da aviação. Operação em pista não homologada ou fechada, destroços movimentados sem autorização do investigador, piloto com CCF vencido, aeronave com o CA vencido, seguro obrigatório vencido, diário de bordo não apresentado, inspeções ou revisões realizadas em oficina não homologada ou sem certificação estão entre as principais violações.
As implicações jurídicas estão relacionadas com as violações. Esse foi o alerta do Suboficial Márcio Patrício, adjunto da Assessoria Jurídica do CENIPA. “A falta de aderência à legislação tem ocorrido não por desconhecimento, mas por vontade consciente de fazer diferente do que a lei preconiza”, reforça.
Depois de esclarecer as diferenças entre a investigação SIPAER (realizada com o objetivo de prevenção) e a investigação policial-judiciária (com o objetivo de responsabilização), a palestra do Suboficial Patrício chama a atenção de todos os que estão ligados à atividade aérea para os envolvimentos judiciais que poderão ter, por dolo ou culpa.
Os participantes
Rosane Duque Estrada Vieira, que trabalha com segurança operacional de navegação aérea na Infraero Brasília, concorda que o número de infrações nos acidentes aeronáuticos é alto. “Esse tipo de evento é importante porque ajuda a disseminar a segurança de voo”.
Adido de Defesa da Bolívia no Brasil, o Coronel Pablo Arturo Guerra Camacho já tem ligações com o SIPAER desde o Curso de Prevenção de Acidentes em Língua Espanhola promovido pelo CENIPA, do qual quatro militares da Força Aérea Boliviana participaram. Ele prestigiou o evento do SERIPA VI, no sábado, e afirmou que os temas escolhidos foram muito relevantes para a especialização do profissional na área de segurança de voo.
Durante o debate, Roberto, servidor público do Estado de Mato Grosso, agradeceu ao SERIPA VI pela promoção do evento que permite a todos “aprenderem mais” e lançou uma discussão: “será que no futuro os diários de bordo serão digitais?”
O Tenente Coronel Mattos agradeceu ao presidente do SEST/ SENAT (Serviço Social do Transporte e Serviço Nacional de Apoio ao Transporte), Carlos Augusto. “O SEST/ SENAT faz parte da família aeronáutica por ministrar curso de manutenção aeronáutica e por permitir, pelo segundo ano consecutivo, que o SERIPA use as suas instalações para um evento de segurança de voo”.
A próxima atividade do SERIPA VI será a Jornada de Prevenção na Aviação Agrícola de Goiás e Mato Grosso.
Fonte: Cenipa
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