O Susto – o perigo do “Brownout”!
14 de dezembro de 2010 4min de leitura
O dia começou frio, mas logo no início da tarde, o sol clareava e esquentava o dia….Por volta das 13:50h, a sirene tocou duas vezes, informando que nova ocorrência de resgate estava acontecendo.
Cada um em sua seção, ao ouvir os toques da sirene, deslocaram-se rapidamente para a aeronave, momento em que fomos informados pelo enfermeiro de que se tratava de ocorrência envolvendo dois caminhões pela Marginal Tietê, entre as Pontes das Bandeiras e da Casa Verde e a vítima encontrava-se presa nas ferragens.
Como o local era muito próximo do Campo de Marte, o Cmt da Aeronave comentou, em tom descontraído, que o melhor local para pouso para essa ocorrência seria o próprio Campo de Marte, onde nos encontrávamos, pois é regra nas missões de resgate evitar ao máximo pousar em ruas e avenidas, procurando sempre um local mais seguro, quando muito, desembarcar o médico e enfermeiro no local e pousar em outro lugar.
Decolamos, sentido Pista 30, onde após curva a esquerda já conseguimos avistar o local na Marginal Tietê, pela pista expressa, sentido leste, e observamos que o trânsito já estava parado, em virtude de já se encontrarem pelo local viaturas policiais e do corpo de bombeiros.
Após breve avaliação pontual da via e também de outras possibilidades pelas imediações e, considerando que o pouso na pista acarretaria enormes conseqüências ao trânsito, uma vez que não sabíamos se a vítima já tinha sido retirada do caminhão ou ainda estaria presa nas ferragens, fato que poderia retardar o atendimento, decidimos efetuar pouso no campo do Clube Tietê, localizado bem próximo do acidente, no mesmo sentido da via, sendo que, após rápida avaliação do Cmt da Aeronave, estabilizou o helicóptero no sentido de sua rampa e entrou na final para pouso…
Era um campo de futebol, que por sinal estava bem castigado, tendo área gramada apenas em suas extremidades, enquanto que o centro do campo era dominado pela terra.
A aproximação foi tranqüila e estável, porém bem próximo ao solo, numa altura que acredito não maior do que 2 metros, iniciou a subida de poeira (piso de terra vermelha), ocasionando o chamado “brownout”, porém ainda mantínhamos visão da região frontal, só que talvez, acredito eu, isso tenha motivado o comandante a efetuar rapidamente o pouso, utilizando a técnica do pouso direto.
No momento do toque dos esquis no solo, a aeronave não estabilizou no ponto, tendo um leve deslocamento para frente e iniciando o chamado pilonamento frontal, fato que por frações de segundo, com o acelerar do batimento cardíaco, somente uma imagem passou pela minha mente: “A pá vai bater no chão, o rotor vai quebrar e espero que não pegue em ninguém”…
Da mesma forma que tudo aconteceu muito rápido, o comandante, agiu de forma emergencial e corretiva, tentando num primeiro momento, na atuação do cíclico a retaguarda, porém, sem resultado, e depois na exigência de potência, atuando no coletivo, efetuando uma puxada brusca para que as pás do rotor não tocasse o solo, arremetendo de imediato, instante em que ao livrar os esquis do solo, a aeronave sofreu uma guinada para a esquerda, levando sua cauda à direita, elevando sua altitude inicialmente um pouco descontrolada, mas, logo em seguida, estabilizando o vôo, alcançando a arremetida com segurança.
Depois disso, observei que na tela do VEMD encontrava-se uma mensagem de Overlimit Detected, situação que expus ao comandante. Diante disso, retornamos para próximo do local, onde o enfermeiro, por meio de gestos, sinalizou da impossibilidade de socorro, abortando a missão e retornando para o Campo de Marte para que pudéssemos avaliar o que teria acontecido com a aeronave e pronto restabelecimento de toda a tripulação, observando no registro do VEMD que o Torque atingira 113%, por 1 segundo.
Esclareço que todos os fatos ocorreram muito rápido. Para mim, acredito que não tenha passado de 3 segundos, desde o toque dos esquis no solo até a arremetida, e confesso que minha reação foi apenas esperar o que iria acontecer, da mesma forma que todo o restante da tripulação, que permaneceram calados durante o desenrolar das manobras.
Nessa espera não falei coisa alguma, nem visualizei o painel da aeronave ou até ouvi qualquer sinal de alarme, somente esperei. E na confiança de que sairíamos dali, pude perceber posteriormente, da mesma forma que o enfermeiro e a médica, que na relação entre Homem e Máquina, Piloto e Aeronave, o helicóptero não respondeu numa fase inicial às intenções do piloto, mas reagiu satisfatoriamente na segunda exigência, em virtude da brilhante capacitação profissional do homem e atuação salvadora do piloto.
E assim, graças aos Anjos e Arcanjos, ao Bom Deus e ao Comandante da Aeronave estamos relatando esse fato, e espero que nunca, nem ninguém, tenha que passar pelo mesmo susto e lembrem sempre do perigoso efeito do “Brownout”.
Texto: EDERSON LUIZ FALCADE, 1º Ten PM – Comandante de Operações – GRPAe/SP
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