Polícia Civil do RS diminui distâncias e custos de operações no Interior com novo avião
08 de agosto de 2022 6min de leitura
08 de agosto de 2022 6min de leitura
Rio Grande do Sul – Os bancos de couro bege que antes transportavam quantias milionárias de cocaína entre a Bolívia e o litoral paulista agora encurtarão as distâncias do Rio Grande do Sul para agentes da segurança pública. Atrás de um painel com dezenas de botões e uma dúzia de alavancas fabricado na década de 1980, três pilotos serão responsáveis por dobrar a capacidade de atendimento aéreo da Polícia Civil gaúcha. O primeiro avião da corporação passou por meses de modernização e levará equipes até Uruguaiana com a mesma agilidade que carros nos levam da Capital até Imbé.
— Qualquer ponto do Estado estará ao nosso alcance em até uma hora e 40 minutos. Um deslocamento até Passo Fundo, por exemplo, que com o helicóptero leva cerca de uma hora e 10 minutos, com o novo avião levará 40 minutos. Uma eventual ida e volta a São Paulo duraria cerca de seis horas — explica o piloto e professor de engenharia aeronáutica na Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS), Frederico Faria, 42 anos, agente da Polícia Federal.
A partir da segunda quinzena de agosto, o departamento de operações aéreas da Polícia Civil do Rio Grande do Sul contará com um avião. O Baron 58, da californiana Beechcraft e com matrícula PP-JGO, foi fabricado em 1981. Depois de ser apreendido pela Polícia Federal em uma operação contra o tráfico internacional de drogas em dezembro de 2019, foi repassado pela Justiça ao RS.
Ele chegou ao hangar da polícia no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, em fevereiro. As últimas manutenções e atualizações na tecnologia terminaram em julho, e a partir de agosto o céu gaúcho terá um novo veículo a serviço das forças de segurança. Desde 2012, a frota aérea da Polícia Civil gaúcha era composta por apenas um helicóptero.
— O avião é apto para voo por instrumentos, com baixa visibilidade, coisa que o helicóptero não podia fazer. Isso é um grande ganho para a Polícia Civil e para a população gaúcha. Muitas vezes, por conta das condições climáticas do nosso inverno, neblina, chuva, não conseguimos alçar voo com o helicóptero, e agora o avião poderá fazer isso — explica o responsável pelo departamento de operações aéreas, delegado Carlos Iglesias Júnior.
Para isso, os pilotos da Polícia Civil estão sendo qualificados, tal qual a aeronave. Faria foi integrado à equipe no hangar do aeroporto Salgado Filho para auxiliar neste processo. Os dois primeiros pilotos da polícia gaúcha que já estão prontos para voar missões no Baron são os porto-alegrenses Allan Bitencourt, 42 anos, na profissão há 13, e Eduardo Worm, 54, voando desde os 14. A experiência deles em outros ramos da aviação e também em operações faz com que a chegada do bimotor seja comemorada.
— Qualquer operação da Civil para transportar um preso, ou um órgão a ser transplantado, ou mandar equipe para investigar algo no Interior vai sair mais barata. Um voo dele de uma hora com quatro pessoas dentro faz o mesmo serviço que comitivas com quatro viaturas e 15 pessoas fariam correndo risco e se cansando ao longo de três, quatro horas de viagem — exemplifica Bitencourt.
— O motor do helicóptero é mais potente e ele pode pousar ou levantar voo em praticamente qualquer lugar, mas o avião tem quase três vezes mais autonomia, além de uma maior durabilidade nas peças e facilidade na manutenção — complementa Worm.
Modelo 81 completo
Durante os procedimentos jurídicos para encaminhar o avião apreendido em operação contra o tráfico em São Paulo para a Polícia Civil do Rio Grande do Sul, a avaliação mecânica revelou uma agradável surpresa aos pilotos e mecânicos gaúchos. Três itens opcionais da fábrica Beechcraft, na Califórnia, que foram instalados ao longo dos 41 anos de operação do veículo, melhoraram o desempenho de um modelo clássico na aviação norte-americana.
Em cima das asas, na borda dianteira, uma dezena de pequenas hastes de alumínio com cerca de cinco centímetros cada estão fixadas perpendicularmente à chapa principal do planador. São as chamadas “aletas”, que caem no diminutivo por serem muito menores do que a estrutura original na extremidade externa da asa. Faria e os pilotos explicam que no momento da aproximação da pista antes do pouso, a asa se inclina e as “aletinhas” servem para direcionar o vento de maneira a reduzir a velocidade da aeronave. Este dispositivo diminui em até 10% a velocidade que normalmente seria de 180 km/h nesta etapa do voo, o que facilita o pouso em pistas menores.
— É mais prático para aterrissar em lugares curtos como aeroportos menores — destaca Faria.
Os outros dois itens que fazem do Baron 58 um completo de luxo são um par de tanques extra de gasolina na ponta das duas asas e o alternador de corrente mais potente disponível para este modelo. A reserva maior de combustível garante mais tempo no ar sem precisar abastecer, e a instalação elétrica fornece melhor funcionamento para os sensores e componentes digitais como GPS, radar meteorológico e comunicadores a bordo.
— Este avião é amplamente usado para pequenas cargas. E este trio de acessórios que instalaram foi apelidado nos Estados Unidos de drug runner kit (kit para traficar drogas, em tradução livre) — comenta, bem-humorado, Worm.
Do crime internacional para a segurança estadual
A investigação que culminou na apreensão do avião bimotor concluiu que ele era utilizado para transportar cocaína entre a fronteira da Bolívia com o Mato Grosso do Sul até o interior de São Paulo. Dali, a carga era levada em caminhões até o porto de Santos, de onde zarpava para ser vendida na Europa.
Cada viagem rendia aproximadamente R$ 15 milhões aos traficantes, pois o bimotor carregava até 500 quilos de pasta base avaliada em R$ 30 mil por quilograma, segundo os pilotos da Polícia Civil. O montante seria suficiente para comprar 10 aeronaves como a Baron 58.
Com o esquema de tráfico desarticulado, os cinco lugares da cabine agora servirão para transportar pelo ar e também apoiar operações da polícia em solo por todo o Rio Grande do Sul.
— Buscamos sempre ampliar e qualificar a capacidade operativa. Encontramos esta em uma apreensão em São José do Rio Preto, sem danos. Fizemos avaliação técnica e encontramos uma boa situação da aeronave para nosso uso — conta o delegado Iglesias.
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