Remoção aeromédica: Responsividade X Violação
08 de outubro de 2017 5min de leitura
MARCELO BORTOLIN
Capitão da Polícia Militar de São Paulo
Piloto do Grupamento de Radiopatrulha Aérea
O Grupamento de Radiopatrulha Aérea da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com 32 anos de existência, opera na Capital do Estado e em mais dez Bases Operacionais destacadas, sediadas nos municípios-sede de Comandos de Policiamento do Interior (CPI).
Conta com uma frota de 23 (vinte e três) helicópteros modelo “Esquilo”, conhecidos como “Águias”, 2 (dois) helicópteros de instrução modelo “Schweizer”, 1 (um) helicóptero biturbina modelo “EC-135”, de propriedade da Secretaria Estadual de Logística e Transportes, e 1 (um) helicóptero biturbina Agusta modelo A109 Grand New, de propriedade da Fundação Florestal, estes últimos também operados pelo GRPAe; além de quatro aviões.
Dois dos tipos de missões que mais elevam o nível de satisfação da equipe de voo envolvida em tais operações são a remoção aeromédica e o transporte de órgãos. De 1984 a 2016 foram 1488 remoções aeromédicas realizadas e 453 transportes de órgãos, dos quais, somente entre os meses de janeiro e setembro de 2016 foram 29 remoções realizadas e 57 transportes de órgãos.
Deste montante a maioria foi em apoio à SES (Secretaria Estadual de Saúde), entretanto, algumas remoções são de policiais militares que, por algum motivo, foi solicitado nosso apoio para a remoção aeromédica.
Alguns poderiam questionar: Isso é função da Polícia Militar?
O embasamento legal se encontra na CF/88, artigo 144, § 5º: “Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública (…).” (grifo nosso). No tocante à Polícia Militar, a destinação constitucional foi mais ampla do que as competências restritivas dos outros órgãos, visto que a doutrina reconhece em suas diversas e variadas abordagens que a Ordem Pública é mais ampla que a Segurança Pública, englobando, além das noções de segurança e tranquilidade, os conceitos de ordem moral, estética, política e econômica.
Não raras são as solicitações da Secretaria para que a Unidade realize apoio com a avaliação e transporte de pacientes necessitados de remoção, através do meio aéreo, visando o menor desgaste e complicações aos quadros clínicos apresentados por pacientes que necessitam de tratamentos em Hospitais com maior recurso.
Os Águias já realizaram diversas remoções em apoio à SES e até mesmo internamente na Corporação, contudo, condicionado além do quadro clínico médico, há que se considerar as condições climáticas, horário de pôr do sol, entre outros fatores, o que geram demandas reprimidas.
Não há registros fidedignos de solicitações, na Unidade, para realizações de remoções aeromédicas cujo impedimento tenha sido motivado pela norma aeronáutica quanto a possibilidade da missão adentrar o horário do pôr do sol e devido ao local de origem do paciente estar fora de uma área controlada ou da área da Terminal São Paulo, ou mesmo de distâncias superiores a 50 Km.
As normas aeronáuticas restringem voos realizados fora de áreas Controladas ou Terminais, ou a distâncias superiores a 50 Km de distância dos locais de decolagem, no período compreendido entre o pôr e o nascer do sol, mesmo em condições de voo visual (VMC), se as aeronaves não forem homologadas para voar sob as Regras de Voo por Instrumento (IFR) e os pilotos habilitados para voo IFR, conforme previsto no item 3.4.2 da Instrução do Comando da Aeronáutica (ICA 100-4). “Regras e Procedimentos Especiais de Tráfego Aéreo para Helicópteros”, do Comando da Aeronáutica, aprovada pela Portaria DECEA nº 53/SDOP, de 10 de julho de 2014.
Na atual frota de helicópteros operada pelo GRPAe para a realização de remoção aeromédica, os Esquilos não são homologados para voo IFR, apenas os helicópteros EC-135 e A109 Grand New; porém, estes não são equipados para a realização de remoção aeromédica.
Contudo, quem trabalha diretamente com a solicitação de tais demandas se recorda de várias consultas para o atendimento de remoção aeromédica, que, por se tratar de impedimento motivador o fato do “voo ser realizado fora de área terminal, durante o período noturno”, mesmo que em condição visual, ficando a operação a ser realizada, caso a situação ainda permita, para o período diurno posterior.
Outro fator relevante a ser considerado é que nas missões de remoção aeromédica de distâncias maiores, via de regra, são realizadas com maca longitudinal e como consequência a aeronave tem apenas um piloto, o que torna a operação menos confortável quanto a navegação aérea.
Aliado ao que foi exposto, temos que nos cercar do principal fator que envolve tais operações: a Segurança Operacional envolvida na missão, minimizando riscos.
Por compartilhar tais angústias, tanto por presenciar a negativa da possibilidade de atender tais demandas, como por questões de se iniciar voos fora de áreas terminais com horário se aproximando do pôr do sol, é que este assunto foi escolhido, inclusive como tema de Mestrado Profissional em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, na busca pela melhor solução à pergunta: Como atender demandas de remoção aeromédica e/ou transporte de órgãos com responsividade (responder rapidamente e de modo mais adequado à situação em questão), sem que para isso fiquemos à margem da violação.
A utilização de helicópteros homologados para operação IFR, bimotor, para atender à exigência da norma aeronáutica, aliado à formação/habilitação em tais máquinas, estará contribuindo ainda mais para uma operação segura e com excelência da nossa Unidade. A exemplo do que ocorreu no Estado de MG com a operação com OVN (óculos de visão noturna), onde tive a oportunidade de conhecer “in loco” tal iniciativa, e outros estados com a utilização de helicópteros bimotores IFR em Operações de Segurança Pública e de Defesa Civil.
Devemos buscar as melhores práticas e na medida do possível implementar novos modelos, ou até mesmo o aprimoramento de nossa operação visando sempre a Segurança Operacional.
Publicação autorizada pelo autor. Originalmente publicado na revista O Águia.
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